Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa



I Colóquio Internacional de Filosofia e Ciências do Homem


I Colloque International de Philosophie et Sciences Humaines
 


I International Colloquium in Philosophy and Human Sciences
 

Michel Foucault
Lei, Segurança e Disciplina.
Trinta anos depois de Vigiar e Punir


Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa, CFCUL
Centro de História e Filosofia da Ciência e da Tecnologia, FCT/UNL
Centro de Comunicação e Linguagens, FCSH/UNL
Institut Franco-Portugais de Lisboa

23, 24 e 25 de Novembro

 

 

 

Instituto Franco Português
Av. Luís Bívar, nº 91, 1000 Lisboa (telf: 21.3111400)

 

Comissão Científica

Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa
Nuno Nabais e Olga Pombo
Centro de História e Filosofia da Ciência da FCT da UNL
António Manuel Nunes dos Santos e José Luís Câmara Leme
Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens da FCSH da UNL
António Fernando Cascais e José Augusto Mourão


 

Tema do Colóquio


A análise do poder não deve ser iniciada a partir da relação primitiva entre os sujeitos que nela perdem ou ganham qualquer coisa, mas a partir da própria relação que os constitui como sujeitos. Este é, hoje, um horizonte teórico partilhado por filósofos e cientistas sociais de proveniência vária, que foi explicitado e formalizado pelo filósofo francês Michel Foucault em duas obras cruciais, Vigiar e Punir (1975) e A Vontade de Saber (1976).

A efeméride dos trinta anos da publicação de Vigiar e Punir, e a edição recente dos cursos proferidos no Colégio de França pelo filósofo, em que ele aprofunda os temas enunciados naquelas duas obras, justificam plenamente a organização de um Colóquio Internacional.

O tema geral do Colóquio é o efeito que as duas obras citadas, bem como os seus cursos no Colégio de França, exercem no modo como a Filosofia e as Ciências Sociais pensam as relações de poder nas sociedades ocidentais. Pois, seja qual for o lugar em que o poder se exerce e sobre o qual se funda um saber e se constitui uma subjectividade - a relação familiar, a prisão ou a circulação mundial de bens e pessoas, entre outros exemplos - os conceitos de que os filósofos, os historiadores e os cientistas sociais se servem nas suas pesquisas sobre esses domínios de estudo revelam a presença da filosofia de Foucault, quer na perspectiva de adesão e aprofundamento, quer na de contestação.

A celebração dos trinta anos da publicação de Vigiar e Punir através da realização de um Colóquio Internacional visa, assim, dois propósitos: por um lado, criar a oportunidade para que todos aqueles filósofos e cientistas sociais que se reconhecem no legado filosófico de Foucault possam apresentar e debater os resultados das suas pesquisas que relevam da problemática referida por outro, através do Colóquio e do seu programa de actividades, projectar e estender o debate em torno do filósofo francês a um público mais alargado.

 

Programa
 

23 de Novembro

9h30


Abertura do Colóquio

Philippe Reliquet (Director do Instituto Franco-Português)

Olga Pombo, António Manuel Nunes dos Santos e José Augusto Mourão

10h

Didier Eribon - La Peste, la Lèpre et la Variole: Épidémiologie des Sociétés Contemporaines

António Fernando Cascais
- O que é um Dispositivo?


Intervalo
 

12h

Philipe Cabau - Arquitectura e Dispositivos de Controlo
 

Philipe Artières - Archives d'un malentendu. Retour sur la table-ronde de l'impossible prison


Intervalo para Almoço
 

15h

Manuela Ivone Cunha - Foucault e a Prisão Contemporânea
 

José Subtil - A Condução da Conduta e a Modernidade Política em Portugal (séc. XVII e XVIII)
 

Diogo Sardinha - Le sens profond de Surveiller et Punir


Intervalo

 

17h30

Vera Portocarrero - Genalogia, Arquivo e Invenção: um uso do Pensamento de M. Foucault
 

José Luís Câmara Leme - Desrazão e Infâmia


 

24 de Novembro
 

10h

António Barbosa - Foucault e a Psicossomática
 

António Cavalcanti Maia - Do Poder Disciplinar à Biopolítica


Intervalo
 

12h

Eduardo Pellejero - Do Dispositivo ao Acontecimento: a Leitura Deleuziana de Foucault
 

Patrícia San Payo - Foucault e Blanchot: a exigência da descontinuidade


Intervalo para Almoço
 

15h

Nuno Nabais - Figuras do Desaparecimento em Vigiar e Punir
 

José Bártolo - Sentidos Vigiados: uma Semiótica da Instrumentalidade em Vigiar e Punir
 

Alexander Gerner - Cavernas da Excepção. Insónias na Saída


Intervalo

 

17h30

Margarida Medeiros - Fotografia e Disciplina: uma Aproximação entre dois Dispositivos
 

Angel Gabilondo Pujol - La Creación de Espacios y las Formas de la Verdad

 


25 de Novembro
 

10 h

José Augusto Mourão - A Guarda dos Sentidos
 

Jacinto Godinho - The Eye of the Power. Um Olhar no Centro do Mundo


Intervalo
 

12 h

Stephanie Wenner - Foucault e Schelling
 

Aurélio Guerra - Foucault e a Questão Islâmica


Intervalo para Almoço
 

15 h

António Cavaliere - Sistema Penal, «Emergência» e Direitos Fundamentais. Reflexão Jurídica segundo a Experiência Italiana

Judith Revel -
Individus, Citoyens, Singularités: une Analytique de la Subjectivité


Intervalo

 

17h30

Peter Pál Pelbart - Biopolítica e Contraniilismo

Toni Negri -
Le Tournant Biopolitique de la Pensée de Foucault




Actividades Paralelas

Exposição fotográfica - Michel Foucault e o Grupo de Informação sobre as Prisões, "Une jounée particulière" d'Élie Kagan, de 14 de Novembro a 3 de Dezembro.


Instalações vídeo:

Concerto - Mécanosphère: Um Gramofone para Benthan, 15 de Dezembro às 22h00.
 

Ciclo de cinema e vídeo - Le monde est un grand asile. (Todas as sessões serão realizadas no Auditório Franco-Português pelas 19h00)

 

Novembro

Dezembro

Segunda, 7

Alphaville de Jean-Luc Godard


Segunda, 5

Comizi d'amore (Enquête sur la sexualité) de Pier Paolo Pasolini

Segunda, 14

San Clement de Raymond Depardon


Quarta, 7

Jaime de António Reis


Terça, 15

Urgences de Raymond Depardon

Un chant d'amour de Jean Genet

Sexta, 9

La moindre des choses de Nicolas Philibert


Segunda, 21

Michel Foucault par lui même de Philippe Calderon et François Ewald

Segunda, 12

Titicut Follies de Frederick Wiseman

Terça, 22

Des prisons aussi de Hélène Châtelain


Terça, 13

Ich glaubte Gefangene zu sehen (I thought I Was Seeing Convicts) de Harun Farocki

Segunda, 28

La mort en direct de Bertand Tavernier

 


Quarta, 14

Die Schöpfer der Einkaufswelten (The Creators Of The Shopping World) de Harun Farocki


Quinta, 15

La rage et le rêve du condamné de Jean-Pierre Krief


Sexta, 16

Sans elle(s) collectif sous la direction d'Anne Toussaint

Palavras de Abertura
 

Colóquio Internacional de Filosofia e Ciências Humanas

Lei, Segurança e Disciplina. Trinta anos depois de Vigiar e Punir de Michel Foucault


 

Ainda que breves, transitórias, abrindo-se na eminência do seu próprio desaparecimento, as palavras que aqui hei-de dizer não serão inteiramente escolha minha. Uma palavra precede a minha palavra. Uma ordem se insinua sob o que direi. Um ritual reclama aqui o seu cumprimento.

Ao ser chamada a tomar a palavra na abertura deste colóquio é previsível que comece por cumprimentar todos os presentes, por agradecer a todos os convidados, às instituições que nos recebem e apoiam, àqueles que connosco partilham responsabilidades de organização. E eu quero agradecer a todos: aos investigadores que vêm de fora, e são onze investigadores que vêm de Espanha, de França, de Itália, da Alemanha e do Brasil aos catorze investigadores que vêm de dentro, daquilo que somos em conjunto, daquilo que inventamos aqui, cada um por seu lado Ao Instituto Franco Português, às Embaixadas de França e do Brasil, à Fundação para a Ciência e a Tecnologia, aos outros dois Centros de Investigação que, connosco, se envolveram na organização deste colóquio (o Centro de História e Filosofia das Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa e o Centro de Comunicação e Linguagem também da Universidade Nova). Sem o apoio de todos, este colóquio não teria saído da improbabilidade em que foi sonhado e as vinte cinco comunicações que aqui serão apresentadas ao longo de três dias de trabalho, sobre áreas tão diversas como Direito, Filosofia, História, Arquitectura, Sociologia, Estética, Psiquiatria, Teoria Literária, Semiótica, não chegariam talvez nunca a ser construídas. Talvez nunca viessem mesmo a ser pensadas. Nunca chegariam a ser ditas.

Ao tomar a palavra nesta sessão de abertura, algures, lá, cabe-me ainda explicar por que razão o Centro de Investigação que aqui represento - Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa - decidiu promover um colóquio sobre o tema «Lei, Segurança e Disciplina. 30 anos depois de Vigiar e Punir» de M. Foucault. Existem três razões principais.

Primeira - porque estamos particularmente interessados em pensar a relação entre a ciência e as instituições em que ela se produz. Não na perspectiva, que é a da Sociologia, que olha a ciência como uma actividade humana entre outras e que, portanto, procura caracterizá-la enquanto tal, mas sim na busca dos procedimentos estruturados, das incorporações históricas, das formas materiais que constituem as condições de possibilidade de produção de ciência, o seu a priori histórico, como diria Foucault. E aqui, a obra Vigiar e Punir revela-se cada vez mais actual e decisiva para pensar essa sombra institucional sobre a qual, ontem como hoje, se recortam as práticas científicas.

Segunda razão - porque temos consciência que Vigiar e Punir permite uma outra compreensão do modo como se constituíram as ciências humanas e, portanto, da sua natureza e especificidade. Num momento em que elas, as ciências humanas, quase deixaram de ser problema para si mesmas e se transformam, cada vez mais, em simples prolongamentos dos regimes de governamentabilidade que era suposto questionarem, é decisivo recordar a sua arqueologia política, rememorar o modo como, desde a sua origem, elas acompanham a história do poder disciplinar.

Terceira e última razão - o Centro de Filosofia das Ciências que represento é dos poucos centros de investigação em Portugal (senão o único) que não se constitui como prolongamento de um departamento universitário, mas, pelo contrário, resulta da convergência de investigadores de diferentes departamentos, diferentes faculdades e mesmo diferentes universidades, que trabalham em áreas de investigação muito diversas ( da Física à Antropologia, da Matemática à Semiologia, da Biologia à Filosofia). Por essa razão, ele está interessado em - e talvez especialmente colocado para - pensar as arquitecturas e as arquitectónicas disciplinares. E, nesse sentido, a questão da disciplina, tal como Foucault a formulou e deu a ver na sua fundamental ambiguidade - enquanto poder normalizador e dispositivo de saber - não pode senão aparecer-nos como um tópico central do nosso trabalho.

Onde pretendo chegar? Que quero eu afinal dizer?

Num colóquio sobre Michel Foucault, saber que, naquilo que fui chamada a dizer, alguma coisa se insinuou sob aquilo que disse saber que, ainda que as tenha escolhido com cuidado, as palavras que pronunciei obedeceram a uma ordem que se cumpriu no meu dizer, essa consciência é qualquer coisa que, aqui - justamente aqui - se torna estridente.

Porquê? Porque, em grande medida, foi Foucault quem denunciou esse sussurrar inquietante que se diz naquilo que se disse, naquilo se dirá.

Estridência feita da incomodidade que decorre de eu saber que, naquilo mesmo que digo, alguém ou alguma coisa se diz em mim e por mim, que estou portanto condenada a obedecer a uma regra que não escolhi.

Estridência feita também da desocultação, do vislumbrar de uma margem qualquer donde - finalmente - a palavra (a minha, a vossa palavra) possa irromper insubmissa, livre e inquietada.

Que isso, aqui, tenha lugar é o desafio que nos está, hoje, aqui, lançado!

Olga Pombo
 


 

Secretariado
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