O livro, o primeiro da série, incide na história das ideias relativas à origem das espécies (parte I) e nos dados originários de diversas áreas científicas que constituem provas, ou argumentos, a favor da evolução (parte II).
As obras completas de Charles Darwin encontram-se disponíveis na internet, num repositório gerido pela Universidade de Cambridge. Escolhemos para incluir neste livro o trabalho Sobre a Tendência de Espécies formarem Variedades; e Sobre a Perpetuação de Variedades e Espécies por Meios Naturais de Selecção, apresentado em 1858. No capítulo 1 reproduzimos este trabalho - o primeiro de Darwin sobre a origem das espécies divulgado publicamente - e também o ensaio de Alfred Russel Wallace sobre o mesmo assunto, divulgado conjuntamente com o de Darwin.
Desde a década de 40 que Darwin vinha acumulando evidências da evolução e teorizando sobre o mecanismo de selecção natural, ideias que partilhou apenas com os amigos mais próximos. Em Junho de 1858, Darwin recebeu um ensaio de Wallace contendo ideias semelhantes às suas. Na carta que acompanhava o ensaio, Wallace pedia a Darwin que o enviasse a Charles Lyell, se lhe reconhecesse valor. Darwin enviou o trabalho a Lyell e a Joseph Hooker, e estes decidiram divulgar conjuntamente o ensaio de Wallace e dois escritos de Darwin - extractos de um manuscrito elaborado em 1839 e um resumo de uma carta dirigida a Asa Gray em 1857 - provando a precedência das ideias de Darwin. Os dois trabalhos de Darwin e a carta de Wallace foram apresentados na Sociedade Linneana, no dia 1 de Julho de 1858, na ausência dos autores. São esses documentos que aqui reproduzimos, precedidos pela carta de apresentação dos mesmos à Sociedade Linneana. Às portas da efeméride que se comemorará em 2009 - os 150 anos da publicação de A Origem das Espécies e o bicentenário do nascimento de Darwin - a publicação destes documentos em língua portuguesa apresenta uma relevância acrescida.
No capítulo 2 efectua-se um breve percurso pela história das complexas relações entre o 'criacionismo bíblico' e as explicações do mundo vivo que foram sendo elaboradas pelos estudiosos da natureza, apresentando-se algumas das soluções encontradas para conciliar a crença na Criação com o estudo científico dos seres vivos. Esse percurso facilita o entendimento das ideias sobre a génese das espécies predominantes na época em que Darwin escreveu A Origem das Espécies, permitindo simultaneamente percepcionar a enorme distância que separa essas ideias da explicação evolucionista que Darwin formulou. Terminando no século XIX, aquele percurso deixa porém de fora a polémica a que atrás aludimos - entre criacionistas e evolucionistas que decorre no presente - exclusão justificada na medida em que a atitude dos naturalistas até ao século XIX - a tentativa de conciliação do criacionismo bíblico com a perscrutação científica da natureza - difere profundamente da das correntes criacionistas surgidas no século XX, as quais se constituíram amplamente em oposição à ciência, aos seus métodos e resultados.
O capítulo 3 aborda justamente o nascimento da Biologia Evolutiva. A autora, tradutora de A Origem das Espécies para as Publicações Europa-América, efectua uma reflexão sobre o 'livro que abalou o mundo', como frequentemente é referido, apresentando algumas das principais ideias nele defendidas e posicionando-as no contexto histórico em que foram desenvolvidas. Esta reflexão, para além de introduzir o leitor no conteúdo da obra, tem o mérito de poder estimular a sua leitura integral. Como a autora escreve, "um século e meio depois da sua publicação, o leitor moderno pode ainda encontrar, não só uma obra contemporânea e inteligível, mas também um manual útil de consulta". De facto, os argumentos nela apresentados a favor da evolução não só permanecem válidos, como foram consideravelmente reforçados e ampliados pelos desenvolvimentos ocorridos nas ciências geológicas e biológicas ao longo do século XX.
A segunda parte do livro incide precisamente sobre os dados que fundamentam a concepção evolucionista do mundo vivo. Apesar da história do evolucionismo ser longa e não linear, e embora a aceitação do darwinismo tenha registado sucessivos avanços e recuos14, a concepção de que as espécies se transformam no decurso do tempo originando espécies diferentes das pré-existentes é hoje consensual na Biologia, consenso que tem na base um enorme manancial de dados provenientes de uma multiplicidade de disciplinas15.
No capítulo 4 reproduzimos outro trabalho de referência na história do evolucionismo - Nada em Biologia Faz Sentido Excepto à Luz da Evolução, de Theodosius Dobzhansky, publicado originalmente em 1973. A afirmação que dá título ao artigo, infinitas vezes repetida e transcrita, é hoje célebre. Ela traduz, com brevidade e particular clareza, o imenso poder explicativo e a poderosa capacidade unificadora do evolucionismo na Biologia. Partindo da perspectiva geocentrista do sheik Abd el Aziz bin Baz, expressa em pleno século XX, para quem o Corão 'e os factos' "provam que o sol se desloca na sua órbita... e que a Terra é fixa e estável", e depois de uma breve passagem por perspectivas religiosas sobre outras matérias científicas, o autor detém-se na questão criação/evolução dos seres vivos, desenrolando um rol de 'evidências' reveladoras da evolução. Volvidas mais de três décadas, a mensagem do texto mantém-se actual e passível de ser dirigida aos inúmeros 'sheiks Abd el Aziz bin Baz' que habitam no planeta.
Prosseguindo a apresentação de dados que fundamentam o evolucionismo, os capítulos 5 a 9 contemplam dados provenientes, respectivamente, da Paleontologia, da Biogeografia, da Anatomia Comparada, da Embriologia e da Biologia Molecular. Darwin, na 'longa argumentação' queA Origem das Espécies é (assim designada pelo próprio), desde logo expôs uma multiplicidade de dados relacionados com o registo fóssil, a distribuição geográfica das espécies, a morfologia dos organismos e o desenvolvimento embrionário. A esses dados vieram posteriormente somar-se muitos outros, alguns provenientes de áreas entretanto surgidas, como a Biologia Molecular. Os autores destes capítulos, não ignorando a historicidade das disciplinas sobre as quais escrevem, e assim os diferentes contributos que ao longo do tempo elas deram para o estabelecimento do evolucionismo, centram-se porém em dados recentes, o que tem a enorme vantagem de oferecer ao leitor um conjunto de conhecimentos actualizados apresentados numa linguagem acessível. '
A encerrar o livro, o capítulo 10 aborda fenómenos ilustrativos da evolução em acção no presente, como a resistência viral e bacteriana a fármacos, ou a modificação das características de algumas populações de pescado. Frequentemente referida como um processo relativamente lento, e assim relevante apenas em grandes escalas de tempo, a verdade é que a evolução de certos organismos, não só é observável durante o período de tempo correspondente à duração média de uma vida humana, como os seus efeitos podem fazer-se sentir em aspectos importantes da vida das pessoas, como a saúde ou a alimentação.