Nem os vereadores da oposição nem os deputados da Assembleia Municipal de Lisboa (AML) terão sido informados antecipadamente sobre o memorando de entendimento para a municipalização da gestão da Carris, a partir de 1 de janeiro de 2017, assinado nesta segunda-feira (21 de novembro), entre a Câmara Municipal de Lisboa e o Governo. Por isso, não puderam sequer apreciá-lo, discuti-lo e votá-lo, como seria expectável sobre uma decisão política com previsíveis fortes implicações administrativas e financeiras.

 

Ambos os órgãos – vereação e assembleia – apenas poderão pronunciar-se sobre o acordo, entre o executivo liderado pelo PS e a administração central, depois do mesmo ter sido já firmado. Tal está a irritar bastante os representantes dos partidos da oposição, que vêem na efectivação do documento que estabelece um novo modelo de exploração para a transportadora rodoviária da capital como uma atitude de “facto consumado” e “pouco respeitadora dos mecanismos democráticos”. E preparam-se, por isso, para exigir à liderança da CML toda a informação sobre o assunto.

 

“Sabíamos que a câmara estava a negociar com o governo a gestão da Carris e que, por isso, este seria o desfecho provável. Não podemos dizer que fomos surpreendidos, mas os termos do acordo agora assinado não foram alvo de discussão, como deveria ter acontecido”, diz ao Corvo António Prôa, vereador do PSD, que promete “exigir ao executivo informação detalhada” sobre o assunto, na próxima reunião camarária, na quinta-feira (24 de novembro).

 

O eleito social-democrata diz que, tal como os outros vereadores da oposição, terá sido informado na quinta-feira da última semana (17 de novembro) sobre a cerimónia de assinatura do memorando. Sem que mais pormenores tivessem sido avançados. “O que, com o actual presidente da câmara não constitui propriamente uma singularidade. Com o seu antecessor, apesar das divergências, sempre havia uma maior partilha de informação”, critica Prôa, salientando, porém, o facto de “aquilo que foi assinado ser apenas um memorado”. Logo, diz, “formalmente, não constitui garantia de nada”. Mesmo apesar das diversas informações ontem tornadas públicas, como a de novos investimentos na frota ou o alargamento das vantagens em alguns passes.

 

Ainda assim, o vereador do PSD considera que o entendimento firmado por Fernando Medina incorre em dois “erros”. “Antes de mais, ao avançar com esta assinatura, a câmara renegou a poder ponderar outros cenários de gestão que implicassem uma melhoria da qualidade do serviço prestado aos utilizadores dos transportes públicos. Não quer dizer que recusamos por completo a municipalização, mas gostaríamos que pudessem ter sido estudadas outras soluções, como a concessão a privados”, explica.

 

Além disso, António Prôa considera “um erro gravíssimo” o avançar para uma gestão da Carris autonomizada da do Metropolitano de Lisboa. “Ao permitir esta desarticulação, a autarquia prepara-se para receber um investimento coxo, amputado dos seus membros”, afirma, antes de considerar “uma ligeireza” o anúncio também ontem feito sobre a criação de uma rede de proximidade. “Essa rede já havia sido criada pela câmara, em 2004, através do Lisboa Porta-a-Porta, e depois passou a ser assegurada pelas freguesias”, diz. Razões mais que suficientes para Prôa pedir mais esclarecimentos.

 

Algo que se preparam para fazer também os deputados do partido na assembleia municipal. “Não houve consulta dos deputados sobre esta questão. E não temos a certeza que a Câmara de Lisboa tenha a capacidade necessária para gerir uma empresa como a Carris”, diz ao Corvo João Magalhães Pereira, eleito pelo PSD na Assembleia Municipal de Lisboa, lamentando o facto de os deputados municipais não terem podido pronunciar-se mais sobre a matéria, desde a realização do debate temático sobre transportes, ocorrido naquele fórum, no início do ano.

 

“Só o PS é que defende a municipalização da empresa, os outros partidos advogam soluções diferentes”, recorda Magalhães Pereira, dizendo que “não faz sentido ter o metro a concorrer contra a Carris, deveriam ambas estar sobre a mesma liderança”. Como são mais as dúvidas que as certezas, o deputado municipal diz ser “muito provável” que a representação do seu partido na assembleia venha a tomar, em breve, uma posição formal sobre a maneira como a CML tem lidado com o dossiê.

 

Também o PCP contesta a forma como o processo tem sido conduzido – além de ser abertamente contra a municipalização da Carris, preferindo vê-la manter-se na esfera da administração central. “Um memorando assinado pela câmara que não é sujeito à apreciação dos órgãos autárquicos não tem qualquer valor. Não se percebe como se procede desta forma, tentando fazer uma retificação à posteriori”, critica o vereador Carlos Moura.

 

O eleito considera que a atuação do executivo chefiado por Fernando Medina nesta matéria constitui “uma inversão total do que deve ser o normal funcionamento das instituições democráticas, algo absolutamente incompreensível”. O vereador comunista garante, por isso, que vai exigir explicações, na próxima reunião de vereação. E acha que “a própria Assembleia Municipal de Lisboa, como um todo, deveria tomar uma posição formal sobre esta questão”.

 

Já o vereador do CDS-PP, João Gonçalves Pereira, sobre a mesma questão, disse ontem à tarde à rádio TSF que tinha sérias dívidas sobre a legalidade do acordo assinado. “Tudo isto está a ser feito ao contrário. Deveria ter ido a reunião de câmara, sido discutido e votado e só depois ser assinado o compromisso”. Por isso, considera Gonçalves Pereira, aquilo a que se assistiu ontem pode não ter sido mais que uma simples “conferência de imprensa, ou seja uma mera manobra de propaganda”.“Sob o ponto de vista formal, o presidente da Câmara de Lisboa não tem mandato para assumir esse tipo de compromissos”, afirma.

 

Questionada pelo Corvo sobre as críticas feitas pela oposição à forma como o processo tem vindo a ser conduzido, a Câmara Municipal de Lisboa respondeu, ao final da tarde desta segunda-feira (21 de novembro), que “o memorando de entendimento foi enviado hoje mesmo para todos os vereadores”. A mesma nota escrita acrescenta que o referido documento “será discutido e votado na próxima reunião pública da CML”.

 

Texto: Samuel Alemão

 

  • Francisco Braz Teixeira
    Responder

    As práticas totalitárias deste executivo.

    • Joaquim Xavier Lopes
      Responder

      Já as praticas totalitarias do Governo anterior foram pôr os portugueses a pagar os desvarios dos bancos.

    • Francisco Braz Teixeira
      Responder

      Porque é que se discute sempre o futebol?

    • Manuel Guedes
      Responder

      O menino da Católica manda bocas no estádio… mas depois não gosta de ouvir as respostas óbvias.

    • Francisco Braz Teixeira
      Responder

      Este executivo tem atitudes totalitárias e absolutistas. Foi isto que eu disse. Não falei neste governo, nem no anterior nem no outro anterior. Podem centrar o vosso discurso no que é escrito em vez de virem mandar bocas?

  • Manuel Guedes
    Responder

    Atenção, O Corvo… 2007 já foi há muito tempo.

    • O Corvo
      Responder

      Obrigado pela chamada de atenção. Está corrigido.

  • Aqui mora gente
    Responder

    Não se percebe como decisões importantes e abrangentes e de longo prazo e que afectam toda a população são tomadas sem discussão pública prévia, independentemente da sua “bondade” ou não. Acontece cada vez mais. A Oposição anda a dormir? Ou as coisas são mesmo feitas “à socapa”? Obras por toda a cidade ao mesmo tempo que ninguém percebe para que servem, dinheiro esbanjado a rodos em obras que não são necessárias quando existem tantas outras coisas urgentes a fazer, ruas fechadas ao trânsito sem que moradores sejam avisados, etc., etc.

  • Paula Gomes
    Responder

    Chama-se a isso poder absoluto do Eu quero, Eu mando, Eu posso!

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