Junta da Misericórdia quer videovigilância no Cais do Sodré e em Santa Catarina

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Samuel Alemão

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Luísa Ferreira

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VIDA NA CIDADE

Misericórdia

29 Novembro, 2013

Os moradores de Santa Catarina unem-se contra o ruído da noite e o tráfico de droga. Criaram uma associação para defesa dos interesses do bairro e do resto da freguesia. A presidente da nova junta da Misericórdia já falou com a polícia, que se mostra impotente. Por isso, diz ao Corvo, vai pedir à câmara municipal a instalação de videovigilância. E gostava de ver proibido o consumo de álcool na rua.

A presidente da nova Junta de Freguesia da Misericórdia, Carla Madeira (PS), vai solicitar à Câmara Municipal de Lisboa a instalação de um sistema de videovigilância nas zonas do Cais do Sodré e de Santa Catarina. Será, no entender da autarca, a melhor forma de ajudar a combater a persistente e difusa sensação de insegurança nestas áreas de grande frequência nocturna e turística. Tráfico de droga, assaltos, ruído excessivo, estacionamento abusivo e vandalismo têm sido motivo de queixa dos residentes, que vêem os problemas de sempre do Bairro Alto consolidarem-se à porta de casa. A autarca recentemente eleita reconheceu, em declarações ao Corvo, as razões de queixa dos moradores, que falam de uma situação insustentável e na necessidade de se tomarem medidas. Carla Madeira gostava, por isso, que a lei fosse alterada para impedir o consumo de bebidas alcoólicas na via pública.

Fartos de ver o bairro onde vivem sofrer as consequências do desregramento de muitos dos que o frequentam, os moradores de Santa Catarina decidiram reunir-se para defendê-lo. É uma espécie de murro na mesa. Um grupo constituiu, há três semanas, A Voz do Bairro – Associação de Moradores de Santa Catarina – Misericórdia e pretende agora começar a pressionar as autoridades, com especial relevo para a Câmara Municipal de Lisboa (CML), para pôr cobro aos problemas relacionados, sobretudo, com a vida nocturna. Ruído, distúrbios, tráfico de droga, estacionamento e uma sensação de generalizada de insegurança estão no topo da agenda do colectivo. “O objectivo é lutar pela melhoria da qualidade de vida dos moradores, em geral, e tentar acabar com estes problemas”, diz Nuno Santos, vice-presidente da associação.

A entidade surge na mesma altura em que começa a vigorar o novo desenho do mapa administrativo das freguesias. No caso, a Misericórdia agrega as antigas freguesias das Mercês, Santa Catarina, Encarnação e São Paulo. Daí a designação da associação, que se afirma como de “defesa dos interesses comuns dos habitantes do bairro de Santa Catarina e da área geográfica inserida na freguesia da Misericórdia”. Uma zona coincidente, quase na sua totalidade, com o coração da vida nocturna lisboeta, nela se inserindo o Bairro Alto, a Bica e o Cais do Sodré. Os problemas nascidos da passagem e do convívio de multidões por aquelas áreas são conhecidos de todos – até já foram objecto de um grupo de trabalho da CML para tentar encontrar soluções. Mas as queixas persistem.

“Estamos um pouco apreensivos com tudo o que se está a passar. Os problemas crónicos do Bairro Alto têm-se estendido até aqui”, lamenta Nuno Santos, referindo-se aos “constantes distúrbios, mau ambiente e roubos que se têm verificado com cada vez mais frequência”. Especialmente visados são os indivíduos que vendem estupefacientes, de noite e de dia, junto ao miradouro de Santa Catarina. Fazem-no há anos, mas agora, alegadamente, sem a vigilância antes exercida pela Polícia Municipal – que ali estacionava o carro patrulha com muita frequência. Algo que terá deixado de acontecer, alegam os membros da associação, desde as obras de arranjo dos principais arruamentos do bairro, concluídas no verão passado.

“Os carros não param [no largo do Alto de Santa Catarina], por causa dos pilaretes”, queixa-se Maria Beltrão, 69 anos, que recorda com saudosismo um bairro onde as pessoas de idade avançada podiam circular nas ruas ou sentar-se no miradouro, sem sentirem medo. Ou onde as crianças brincavam na rua. E isso não foi assim há tanto tempo. “Isto era bem frequentado, até há mais ou menos uma década ou 15 anos”, dizem Maria e a amiga Vigília Lopes, de 61 anos. “Os problemas do Bairro Alto têm-se estendido até aqui”, considera Nuno Santos, que, ao final da tarde de 16 de Setembro, viu a sua irmã ser assaltada por esticão, perto do miradouro. Em plena luz natural, ela ficou sem um fio de ouro.




 

Os moradores relacionam a crescente sensação de insegurança com o aumento da frequência quer de pessoas que procuram diversão nocturna, quer, no caso particular de Santa Catarina, de turistas estrangeiros ou de portugueses em busca de estupefacientes. Os locais de venda e os vendedores são conhecidos. Mas o que se vende ou tenta vender na Rua Marechal Saldanha e arredores, e também junto ao miradouro, estará, afinal, na origem da alegada incapacidade da polícia em resolver o problema, informa a presidente da Junta de Freguesia da Misericórdia. “Já tive uma reunião com a PSP do Bairro Alto e eles dizem-me que não podem fazer muito, porque o que é ali vendido são folhas de louro prensadas, e não uma substância ilícita”, diz ao Corvo Carla Madeira. Quando muito, os agentes poderão autuar os alegados traficantes por venda de bens sem licença.

 

“Mas admito que haja ali algum tráfico de droga”, diz a autarca. Até porque as queixas dos moradores são continuadas, relativas à insegurança, aos desacatos, ao vandalismo ou ao barulho. “Estou preocupada com a questão, como é óbvio”, assegura a edil, que, ante a declarada impotência da polícia, só vê uma resposta eficaz: “A videovigilância poderá ajudar a afastar esses indivíduos. A dimensão do problema justifica que se alargue ao Cais do Sodré e a Santa Catarina a videovigilância, que, em breve, deverá começar a funcionar no Bairro Alto”, afirma Carla Madeira, que vai propor à Câmara Municipal de Lisboa esta opção tecnológica para aquela área. “Não resolve tudo, mas inibe esses comportamentos”.

 

A autarca considera, no entanto, que são necessárias outras medidas para apaziguar de vez a reiterada convivência turbulenta do “distrito de diversão nocturna” com uma área tradicionalmente residencial, como é a freguesia por si administrada. E que passam pela Assembleia da República. “É preciso que se pense em produzir legislação que proíba o consumo de álcool na via pública”, defende a presidente, para quem muitos dos distúrbios estão relacionados com essa questão. A câmara já tentou colocar travão ao que é conhecido como fenómeno do “botellón“, mas sem muito sucesso.

 

A presidente da junta – que diz querer ter uma relação próxima com a nova associação de moradores, pelo que vai tentar reunir-se em breve com eles – promete também disciplinar o estacionamento automóvel abusivo. Várias soluções estão a ser estudadas, sendo que uma delas passa pelo recurso a silos. Em princípio, os residentes de Santa Catarina poderão vir a utilizar o silo que deverá ser inaugurado na Rua do Diário de Notícias, no Bairro Alto. Fora de questão está a retirada dos pilaretes recentemente instalados. “Seria um retrocesso”, alega.

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COMENTÁRIOS

Comentários
  • Carla Fidalgo
    Responder

    Excelente reportagem, parabéns e muito obrigado!

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