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Newsletter 5 – Arquivo de Ciência e Tecnologia

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Francisco Leite Pinto

A 22 de julho de 1967, no Palácio de São Bento, decorria a tomada de posse do primeiro presidente da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), Francisco de Paula Leite Pinto (1902-2000).

A JNICT fora formalmente criada na semana anterior, em 11 de julho, pela Presidência do Conselho, com o objetivo de “planear, coordenar e fomentar a investigação científica e tecnológica no território nacional”.

Com 65 anos então, Francisco Leite Pinto tinha um percurso notável e reconhecido. Detentor de uma ampla formação académica, era licenciado em Ciências Matemáticas, tinha o curso de engenheiro-geógrafo, ambos pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (1924), tendo ainda frequentado a Escola Normal Superior da Universidade de Lisboa (1927). No início dos anos 30, como bolseiro da Junta de Educação Nacional, diplomou-se em Engenharia Civil na conhecida École Nationale des Ponts et Chaussés (1932) e preparou uma dissertação de doutoramento no Observatório de Astrofísica, na Universidade de Paris (1933).

A par de uma carreira académica – foi professor catedrático no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras da Universidade Técnica (1940), na Escola do Exército (1948) e no Instituto Superior Técnico (1949) – desenvolveu um percurso político-administrativo, ligado a diversas instituições científicas, que o levou a secretário-geral da Junta de Educação Nacional (1934-1936) e depois do Instituto de Alta Cultura (IAC) (1936-1939), a vice-presidente da Junta de Energia Nuclear (que ajudou a criar) e simultaneamente presidente da Comissão de Estudos de Energia Nuclear do IAC (1954-1955) e que culminou com a pasta da Educação Nacional (1955-1961).

Leite Pinto destacou-se no universo da educação nacional, sendo uma das personalidades que preparou o caminho para o estabelecimento de uma “política científica nacional”, nomeadamente dando resposta à forte influência que a OCDE viria a promover na transição para os anos 60, colmatando o deficiente protagonismo da investigação a nível político, consciencializando as elites políticas sobre os assuntos de organização e administração da ciência.

Nos anos 60, depois de deixar a pasta da Educação, ainda ocupou o cargo de presidente da Junta de Energia Nuclear (1961-1967), que abandonou para se ocupar dos destinos da JNICT, foi administrador da Fundação Gulbenkian (1967-1969) e reitor da Universidade Técnica de Lisboa (1963-1966).

A Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica

Com a criação da JNICT, em 1967, entrou-se num processo de convergência entre a Ciência e a Política, o que representa, sem modéstia, a primeira tentativa de estabelecimento de um verdadeiro sistema científico. A opinião dos investigadores parece mesmo convergir para o facto de a JNICT ter tido, desde o início, o objetivo de preparar uma política científica e coordenar a investigação e a cooperação científica num plano nacional e internacional. É ponto assente que a construção de uma cultura de política científica se deveu à atuação da JNICT nos primeiros anos, e até 1974, associada à experiência das instituições e personagens ligadas à organização da ciência em Portugal.

O aparecimento de uma instituição como a JNICT no quadro da Administração Pública portuguesa ficou a dever-se, em parte, à ação, dinamismo e perseverança daquele que foi o seu primeiro presidente. Na realidade, Leite Pinto insistia há muitos anos, junto de António de Oliveira Salazar, na criação de uma Junta coordenadora de toda a investigação científica e tecnológica desenvolvida não só nas universidades mas também noutros organismos, públicos e privados.

A vertente de financiamento da JNICT, se bem que pensada e referida no diploma criador, apenas surgiria anos mais tarde, marcando de forma indelével os últimos decénios de atividade desta instituição, já num quadro de integração europeia.

A presença de Leite Pinto à frente da JNICT, entre 1967 e 1971, foi determinante pela sua atitude persuasiva em lançar um organismo desta natureza. Contribuiu de forma decisiva para a instalação e expansão da Junta, alargando e consolidando algumas esferas de atuação, nomeadamente através da criação de comissões permanentes, representativas de setores estratégicos para a política científica nacional. Teve também um papel relevante na cooperação científica, promovendo visitas de políticos e cientistas estrangeiros e fazendo uso dos seus conhecimentos no meio internacional.

A estrutura organizativa da JNICT, nos seus primeiros anos, era relativamente simples (se a compararmos, por exemplo, com a estrutura existente por altura da sua extinção, em 1997), sendo composta pelo Presidente, pelo Conselho Geral, pelo Conselho Administrativo e pela Comissão Executiva.

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Organograma da JNICT (1967)

Nos primeiros tempos, a Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica funcionou com parcos recursos, em dois gabinetes (os mesmos onde se encontrava provisoriamente, desde 1959, a Comissão INVOTAN…) do Palácio de São Bento, sede da Presidência do Conselho, passando em 1969, para instalações na Rua Barata Salgueiro e na Rua Tomás Ribeiro.

A atividade da JNICT nos primeiros anos de existência confunde-se, segundo Tiago Brandão, com a própria atividade individual de Leite Pinto. Genericamente, a par da participação ou da coordenação da participação em reuniões internacionais (NATO, OCDE, ONU), Leite Pinto dedicou-se à gestão das bolsas dos programas científicos da NATO, acumulando a função de presidente da Comissão INVOTAN, que acabaria por ser integrada na JNICT, em 1970.

A partir de 1970, aproveitando as conclusões de alguns grupos de trabalho, bem como o incremento das relações internacionais, Leite Pinto promoveu a criação de algumas comissões permanentes na JNICT, em áreas consideradas cirúrgicas.

Assim, surgiu então a Comissão Permanente de Estudos do Espaço Exterior resultante da participação em reuniões internacionais; a Comissão Nacional do Ambiente resultante, em parte, dos trabalhos efetuados sobre a poluição do estuário do Tejo, com a participação da NATO; a Comissão Permanente para a Cooperação Científica e Técnica com as Comunidades Europeias e com a OCDE, denominada COCEDE, consequência de um convite da CEE ao Governo português para colaborar nos projetos COST.

Em Outubro de 1971, Leite Pinto reformou-se e deixou a JNICT sendo substituído, pouco tempo depois, pelo sub-secretário de Estado do Planeamento Económico, João Salgueiro.

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Artigo elaborado com consulta às seguintes publicações, catalogadas no Arquivo Histórico de Ciência e Tecnologia

BRANDÃO, Tiago – A Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (1967-1974). Organização da ciência e política científica em Portugal, Lisboa, 2012 (dissertação de doutoramento apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa).

JUNTA NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA – JNICT. 20 anos de actividade, Lisboa, 1987.

ROLLO, Maria Fernanda, et al. – Ciência, cultura e língua em Portugal no século XX. Da Junta de Educação Nacional ao Instituto Camões, Lisboa, 2011.

SOCIEDADE DE GEOGRAFIA, INSTITUTO TECNOLÓGICO E NUCLEAR – Francisco de Paula Leite Pinto – 1902-2000 – Homem da ciência e da cultura, Lisboa, 2002.