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O Diagnóstico do Sistema Nacional de Investigação e Inovação

Portugal tem um sistema de investigação e inovação (I&I) completo, mas é necessário resolver as suas fragilidades e maximizar o seu potencial, principalmente no que diz respeito à transferência de conhecimento para a atividade económica. Eis a principal conclusão da primeira análise a fundo ao sistema de I&I nacional, feita pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), descrita no relatório “Diagnóstico do Sistema de Investigação e Inovação – Desafios, forças e fraquezas rumo a 2020”.

FCT - CONFERENCIA PUBLICA FUNDAÇÃO PARA A CIENCIA E TECNOLOGIA - FUNDAÇÃO CHAMPALIMAUD

Realizado por uma equipa inter-departamental da FCT, o relatório olha para o passado – para o período de 2000 a 2010 – mas prepara o futuro, concretamente o próximo programa quadro de financiamento Europeu para 2014 a 2020. Como salientou o Ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, na conferência em que o relatório foi apresentado, “Uma estratégia de desenvolvimento sustentado impõe políticas de investigação e inovação coerentes, ajustadas à diversidade de potencialidades, às oportunidades e aos constrangimentos das diferentes regiões do país. Uma coerência só alcançável com informação rigorosa e sistemática das nossas forças e potencialidades, mas também das nossas debilidades”.

Este relatório constitui, desta forma, um instrumento de informação crucial para decisores políticos (nacionais e regionais), empresas, instituições de ensino superior, centros de investigação, investigadores e gestores de candidaturas, programas e projetos de investigação científica.

Envolver os diversos atores do sistema

As várias comunidades de stakeholders e atores do sistema de I&I aderiram em massa a esta iniciativa, participando ativamente na discussão do relatório através das apresentações convidadas na conferência. De facto, há muito que não havia uma conferência sobre política de I&D+I com uma participação tão abrangente de todos os atores: universidades, laboratórios de estado, incubadoras, laboratórios associados, empresas de todo o espectro, desde os sectores mais tradicionais (Galp) aos mais intensivos em conhecimento, quer spin-offs, quer consolidadas (NovaBase, Critical Software, NECTON).

A FCT congratula-se com o envolvimento empenhado dos vários atores e espera manter esta adesão na segunda fase do processo de elaboração de uma estratégia baseada na investigação e inovação para uma especialização inteligente – uma condição prévia para a utilização de Fundos Estruturais europeus (Fundos de Coesão Regional e Horizonte 2020) no período 2014-2020. A especialização inteligente permitirá, segundo a Comissão Europeia, a concentração de recursos humanos e financeiros limitados nas áreas com maior potencial em termos de vantagem competitiva, a nível nacional no caso de Portugal, mas em estreita articulação com estratégias regionais.

FCT - CONFERENCIA PUBLICA FUNDAÇÃO PARA A CIENCIA E TECNOLOGIA - FUNDAÇÃO CHAMPALIMAUDFeito o diagnóstico das forças, fraquezas e oportunidades do sistema nacional de I&I, a nível nacional e regional (ver caixa para as principais conclusões), a segunda fase será de identificação das áreas temáticas em que Portugal apresenta vantagens competitivas, científica e economicamente. Os atores do sistema de I&I têm uma palavra a dizer, e serão de muita importância nesta fase que agora começa, também sob coordenação da FCT.

Assentará no envolvimento de investigadores, empresários, instituições de ensino superior e de investigação, decisores nacionais e regionais, em workshops temáticos que cruzam e agregam temas científicos, económicos e os grandes desafios societais nacionais e Europeus.

Os relatórios produzidos nestes workshops temáticos possibilitarão a escolha, pelos decisores políticos, de prioridades estruturais e temáticas, nacionais e regionais, e informarão as estratégias nacionais e regionais a serem apresentadas à Comissão Europeia por altura da assinatura do contracto com a Comissão.

Ao serviço dos atores nacionais

FCT - CONFERENCIA PUBLICA FUNDAÇÃO PARA A CIENCIA E TECNOLOGIA - FUNDAÇÃO CHAMPALIMAUDSão já vários os sinais da pertinência do relatório, junto de diferentes atores do sistema nacional de I&I. Numa entrevista ao jornal Público, o Diretor-Geral da COTEC, Daniel Bessa, referiu-se aos dados do relatório relativos à distribuição nacional dos sectores económicos de baixa, média e alta-tecnologia, para chamar a atenção para a necessidade de contrariar a “estagnação” da exportação por sectores de alta tecnologia, e reiterar a disponibilidade da COTEC em contribuir para o processo de definição de estratégias em curso.

Também as Comissões Coordenadores para o Desenvolvimento das Regiões têm recorrido aos dados reunidos no estudo da FCT na elaboração das suas estratégias regionais de especialização inteligente.

No documento que estabelece os pressupostos do Acordo de Parceria a negociar entre Portugal e a Comissão Europeia, estabelecendo as principais linhas de intervenção dos fundos europeus estruturais e de investimento no ciclo 2014-2020, as prioridades enumeradas para a promoção da “competitividade e internacionalização” são substanciadas pelos resultados do estudo, nomeadamente as prioridades de reforço da articulação entre empresas, instituições do sistema científico e tecnológico, agências públicas e utilizadores, a atração de cientistas e engenheiros altamente competitivos para as instituições de I&D nacionais e o estímulo a integração de doutorados nas empresas (ver caixa para principais conclusões do relatório).

A necessidade de uma maior articulação entre a investigação e a atividade económica foi um dos temas da conferência organizada pelo Ministério da Educação e Ciência, no passado dia 27 de maio, que contou com a presença de vários ministros e foi aberto pelo Primeiro Ministro, Pedro Passos Coelho. O ministro da Educação e Ciência afirmou que “É imprescindível que (as empresas) olhem para a ciência que fazemos como um factor determinante de competitividade internacional no mundo global (…) Que encarem o emprego de jovens altamente qualificados como uma vantagem”.

Foi anunciado, pelo Primeiro Ministro, a possibilidade de “ponderar incentivos fiscais, assim como fundos europeus, que promovam o desenvolvimento de inovação aberta, para que o investimento em investigação e desenvolvimento nas empresas não se limite às atividades próprias.”

O Primeiro Ministro não negligenciou o papel do investimento público na ciência, acrescentando, “Ter o objetivo de aumentar o investimento privado em Ciência e Tecnologia não compromete o papel insubstituível do investimento público. Temos de continuar a investir recursos públicos nesta área estratégica, mas temos de garantir que continuaremos a investir bem, com inteligência e critério, seja nos projetos individuais, seja nas instituições”.

FCT - CONFERENCIA PUBLICA FUNDAÇÃO PARA A CIENCIA E TECNOLOGIA - FUNDAÇÃO CHAMPALIMAUDNesta conferência, a Secretária de Estado para a Ciência, Leonor Parreira, argumentou a favor da manutenção do investimento público em investigação fundamental como um dos critérios inteligentes a seguir. Recorrendo, entre outros argumentos, a dados da OCDE incluídos no relatório da FCT, que mostram que em Portugal apenas 21% da despesa em I&D tem sido dirigida para investigação fundamental, a Secretária de Estado defendeu que a solução do problema  da insuficiente transferência de conhecimento para o tecido produtivo não estará em reduzir “a já magra quota da ciência básica” e dirigir as políticas públicas de investimento em ciência exclusivamente para “atividades de retorno mais imediato, esperando que com isso se resolva o problema”.

A FCT, como principal agência pública de financiamento de I&D nacional (das instituições públicas e também das empresas), retoma o papel de organizador de espaços de discussão coletiva das estratégias de I&I nacionais, informando a formulação das políticas nacionais e europeias, com o objetivo de preparar a comunidade de I&I para os desafios que se avizinham.

 

Resumos das principais conclusões do Relatório “Diagnóstico do Sistema de Investigação e Inovação”

I.          Portugal tem um sistema de investigação e inovação “completo”

  • A despesa e os recursos humanos em I&D aproximaram-se da média Europeia: “a diferença na despesa em I&D face à média da UE27 passou de -1,13 p.p. (em 2000) para -0,41 p.p. (em 2010) e no Pessoal total em I&D passou de -0,48 p.p. (em 2000) para -0,11 p.p. (em 2010)” (p. 107)
  • Portugal apresenta o maior crescimento em número de  publicações científicas entre os países de benchmarking (*) do estudo, com um factor de crescimento de 3,5, entre 2000 e 2010.
  • A produção científica tem aumentado em todas as áreas científicas, assim como o número de publicações resultantes de colaborações internacionais.
  • As regiões apresentam especialização científica, reflectida na distribuição da produção científica por áreas científica: “Centrando a análise apenas nos 10 domínios com maior número de publicações por região, verifica-se que no Norte e em Lisboa prevalecem os domínios das Engenharias; no Centro e na Madeira, domínios das Ciências Exatas, no Alentejo, Algarve e Açores, domínios das Ciências Naturais” (p. 149).
  • Existe uma relação entre a especialização económica e a especialização científica, principalmente evidente nas indústrias transformadoras e de baixa/media intensidade tecnológica. Por exemplo, entre as indústrias dos têxteis, vestuário e calçado e as Ciências dos Materiais (Têxteis). Nas indústrias de alta intensidade tecnológica (pouco expressivas em Portugal em termos do número de pessoas que emprega), esta relação também existe. Por exemplo, entre a indústria farmacêutica e as áreas da Saúde, Biotecnologia e Microbiologia Aplicada.
  • Existe circulação e co-produção de conhecimento, entre os componentes do sistema: quer entre universidades/institutos de investigação e empresas, quer entre universidades/institutos de investigação, institutos de interface (ex: INESC Porto, INEGI, Instituto Pedro Nunes) e centros tecnológicos (ex: Centro Tecnológico das Indústrias Têxtil e Vestuário). (A partir dos dados de participação nos projetos do Programa de SI I&DT do QREN, 2007 a 2012).
  • Mais de 75% da despesa em I&D concentra-se em investigação aplicada e desenvolvimento experimental; apenas 21% se destina à investigação fundamental.

II.        É necessário reforçar o sistema de I&I e resolver as suas fragilidades

  • Quando comparado com os países de benchmarking, a comunidade científica portuguesa apresenta baixa produtividade (em termos do número de publicações por investigador) e baixo impacto internacional das publicações (medido pelo valor do H-index).
  • Ainda comparado com os países de benchmarking, as universidades portuguesas também apresentam baixos índices de impacto da produção científica.
  • Portugal apresenta um número muito reduzido e insuficiente de pedidos de patentes.

III.     É necessário maximizar o potencial do sistema implementando estratégias nacionais e regionais

  • Nas empresas, as atividades de inovação mais frequentes em Portugal têm ainda fraca intensidade em conhecimento, centrando-se na aquisição de maquinaria, equipamento e software e em atividades de melhoria do potencial da empresa, como a formação para atividades de inovação.
  • Portugal é o país com menor taxa de doutorados empregados no sector empresarial (apenas 2,6%), em comparação com os países de benchmarking.
  • Os objetivos socioeconómicos com maior despesa total de I&D não coincidem com os grandes desafios societais da estratégia Europa 2020. Os quatro principais objetivos socioeconómicos, para que se direciona 76% da despesa em I&D, são a promoção da produtividade e das tecnologias industriais, a promoção geral dos conhecimentos, transportes, telecomunicações e outras infraestruturas, e saúde.

(*) Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, Holanda, Irlanda, Itália, Noruega e a República Checa