O número de moléculas numa célula e a arquitetura da divisão celular
Em cada divisão celular, uma célula mãe dá origem a duas células filha com a mesma informação genética da célula mãe. A informação genética de uma célula está contida no seu DNA, cujas longas cadeias estão “super” enroladas em torno de proteínas chamadas histonas, formando os cromossomas. Para assegurar a distribuição equitativa da informação genética durante a divisão celular, cada cromossoma duplica-se ficando as cópias unidas num único ponto – o centrómero. É no centrómero que se reúnem todas as moléculas necessárias à separação eficaz dos cromossomas: se a localização do centrómero for alterada, ou se as proteínas que o constituem forem danificadas, corre-se o risco de uma divisão celular anormal, com consequências graves para a célula e para o organismo.
Sabe-se que uma das proteínas essenciais para a formação do centrómero é a CENP-A. Num estudo que contou também com financiamento da FCT, um grupo de investigação do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), liderado por Lars Jansen, conseguiu determinar o número de moléculas de CENP-A que são necessárias para que o centrómero se forme no local apropriado no cromossoma. Pode parecer uma questão de pormenor – o determinar quantas moléculas são necessárias para formar esta estrutura microscópica – mas os resultados deste estudo revelam também o mecanismo pelo qual as células conseguem, através da regulação do número de moléculas de CENP-A, assegurar que a separação dos cromossomas se realize de forma fidedigna.
Recorrendo a várias técnicas de engenharia genética muito recentes, a equipa do IGC determinou que os centrómeros de células humanas contêm cerca de 400 moléculas de CENP-A, e que este número é essencial para que os centrómeros se formem no local devido. Descobriram que quando os cromossomas se separam, as moléculas de CENP-A são distribuídas aleatoriamente entre as duas cópias do cromossoma, e que este número de moléculas de CENP-A – 400 – assegura que, nessa distribuição aleatória, o número de moléculas de CENP-A associadas a cada cópia do cromossoma seja sempre suficiente para que se forme um novo centrómero nesse cromossoma. Ou seja, como refere Lars Jansen, o número de moléculas de CENP-A explica “a formação e a hereditariedade dos centrómeros”.
Dani Bodor, estudante de doutoramento no grupo, com uma Bolsa de Doutoramento FCT, realça a dificuldade técnica do trabalho realizado, “Inspirámo-nos numa metodologia já utilizada em leveduras [de ligar um gene que produz uma proteína fluorescente ao gene da CENP-A] que, até agora, ninguém tinha usado para quantificar moléculas em células mais “complexas”. As células de levedura têm todas mais ou menos a mesma forma e volume, mas as células humanas diferem em forma e volume, o que aumenta o grau de complexidade perante este tipo de técnicas”.
Este estudo, publicado na revista científica eLife, de acesso aberto, foi realizado em colaboração com investigadores da Harvard Medical School (EUA), da Universidade da Pensilvânia (EUA) e da Universidade da Califórnia – La Jolla, EUA). Além de financiamento FCT, a investigação contou ainda com financiamento da Organização Europeia de Biologia Molecular (EMBO), Comissão Europeia, Conselho Europeu de Investigação, National Institute of Health (EUA), Burroughs Wellcome Fund (EUA), Rita Allen Foundation (EUA) e Beckman Laser Institute (EUA).