Novo projeto refina dados de perigosidade sísmica em Portugal
“Os sismos são intrinsecamente imprevisíveis”, afirma João Duarte Fonseca do Instituto Superior Técnico (IST), coordenador da equipa que pretende produzir, nos próximos três anos, um novo mapa de perigosidade sísmica para Portugal. O projeto SEICHE, financiado no âmbito do concurso nacional para projetos de investigação 2012, na tipologia “ linhas de investigação de excelência”, criará condições para a sua concretização.
A incerteza associada à ocorrência de sismos impõe, antes de mais, investir na prevenção. A minimização dos riscos está, em primeira instância, nas mãos duma acurada definição científica de zonas com diferentes níveis de perigo. Este zonamento da perigosidade sísmica serve de base à tomada de decisões relativamente à qualidade da construção e definição da localização não só de edifícios, mas também de barragens, pontes, viadutos, centrais nucleares e de todas as estruturas potencialmente vulneráveis.
SEICHE é o acrónimo do projeto “Sismicidade do interior das placas – desafios para a avaliação da perigosidade”, direcionado exactamente para esse objetivo: identificar mais refinadamente as falhas geológicas com capacidade de produzir sismos em Portugal, atribuindo-lhes uma probabilidade de atividade e concebendo um mapa com indicação dos diferentes graus de perigo associados a cada região.Conduzida no Laboratório de Sismologia do IST, a investigação envolve a recolha massiva de dados para uma análise probabilística robusta, facilitadora da extrapolação para o futuro, através duma abordagem multidisciplinar que permite recuar até 100 000 anos na história geológica de um dado local.
Recorre, para isso, a documentos históricos, com relatos e descrições dos maiores sismos ocorridos em determinada região e, para eventos mais recentes, aos catálogos sísmicos obtidos a partir de registos instrumentais, com início na década de 1940. Os dados obtidos a partir destas fontes nem sempre são exaustivos, verificando-se algumas lacunas de informação e imprecisões relativamente à dimensão e localização dos eventos.
Por isso, o projeto inclui na sua metodologia a aplicação de técnicas de paleosismologia que permitem o reconhecimento e estudo das marcas deixadas por sismos na crosta terrestre. A equipa é pioneira na utilização destas técnicas que, reconhece João Duarte Fonseca, “na região do Vale Inferior do Tejo é desafiante, devido à rápida erosão provocada pelo leito do rio”.Paralelamente, modelos digitais do solo e imagens aéreas apoiam a identificação de formas anómalas no terreno que podem indiciar deformações sísmicas, por exemplo, alterações subtis nos cursos de água.
Com experiência de mais de 20 anos em investigação nesta área, o sismólogo demonstra-se preocupado com a “incoerência entre o regulamento de construção anti-sísmica em vigor, que é extremamente exigente, e o zonamento sísmico atualmente vigente, que lhe serve de base e que é extremamente deficiente”. Em suma “os regulamentos não refletem os resultados da investigação”.Para além disto, a comparação entre o novo mapa de perigosidade sísmica para a Europa, resultado do projeto europeu SHARE (Fig. 2), e o mapa correspondente em vigor em Portugal (Fig.1), documenta “a necessidade de aprofundar a investigação nesta área”, alerta o coordenador do SEICHE.
Explica o investigador, que “Os edifícios são sensíveis à vibração do solo com períodos próximos de 1 segundo. As duas figuras revelam discrepâncias importantes no valor máximo da perigosidade sísmica: por exemplo, para Lisboa, o mapa em vigor para Portugal aponta para o dobro do valor dado pelo mapa do projeto SHARE. O padrão geográfico é também muito distinto, com o mapa do projecto SHARE a realçar a contribuição das falhas do Vale Inferior do Tejo e o mapa de perigosidade vigente em Portugal (Fig.2) a refletir principalmente as fontes no oceano a sudoeste do Cabo de São Vicente”.Atualmente em fase de arranque, o SEICHE é um dos 30 projetos “em linhas de investigação de excelência” financiados no concurso 2012, nesta nova tipologia. Referindo-se a este apoio, o investigador salienta a sua “relevância para a estabilidade e continuidade” desta linha de investigação e congratula-se com “o reconhecimento da pertinência da investigação que se faz em função da sociedade”. Estão materializados num só projeto dois pilares do Horizonte 2020: excelência e desafios societais.