Túnel de Alcântara-Mar: longe da vista, longe da reabilitação

ACTUALIDADE
Laura Alves

Texto & Fotografia

URBANISMO

Alcântara

24 Abril, 2013


É uma terra que parece ser de ninguém, e ninguém parece ter interesse por ela. A estação de comboios de Alcântara-Mar, que com um poético nome se mantém em funcionamento – encravada entre as movimentadas avenidas da Índia e de Brasília – encerra um escuro segredo subterrâneo. O túnel pedonal, que funciona como acesso às linhas de comboio e serve igualmente de passagem para a zona das Docas, junto ao rio, há muito que pede obras de requalificação. Mas Lisboa parece ter-se esquecido de uma simples infra-estrutura que, insignificante para alguns, é ainda assim um dos poucos elos de ligação do bairro de Alcântara com o rio, e uma das portas de entrada de turistas vindos do Terminal de Cruzeiros ali mesmo ao lado.

Numa zona onde confluem diversas vias e os carros se cruzam em grande velocidade, chegar ao edifício da estação não é fácil. Não existe, aliás, um acesso directo a partir da Avenida da Índia, pois nesta via não foram incluídas passagens para os peões. O acesso faz-se, assim, através de uma escadaria e de uma passagem subterrânea, onde permanece ainda um resquício da estrutura de ferro que, em tempos, fazia a ligação com a estação de Alcântara-Terra – uma passagem que foi desmantelada há já alguns anos. Perdemos alguns minutos a observar a entrada do subterrâneo e, mesmo antes de descer, percebemos que as escadas rolantes não funcionam. Uma situação reforçada por uma poça de água a tapar os últimos degraus e uma folha de papel com um “Fora de serviço” e a marca da REFER.

Um casal de turistas procura a melhor forma de transpor a linha de comboio para o lado de lá e, após alguma hesitação, desce as escadarias. A relutância não é injustificada. As infiltrações são uma constante no túnel que, à degradação e falta de manutenção, junta ainda o corriqueiro vandalismo de sábado à noite na cidade: tags e grafittis amadores multiplicados pelas paredes e um omnipresente odor a urina. Podemos ainda ir mais longe. Uma cadeira de rodas, um carrinho de bebé ou uma simples bicicleta cujo dono não tenha capacidade de a carregar ao ombro terão algumas dificuldades em fazer esta travessia ou apanhar um comboio, pois além das escadas rolantes disfuncionais não existe uma única rampa em qualquer ponto da estação.

Neste jogo, porém, todos parecem passar a bola ao próximo. Sendo o próximo, neste caso, a Câmara Municipal de Lisboa (CML). Tanto a CP como a REFER, contactadas pel’O Corvo, relegam para a autarquia a responsabilidade da manutenção e requalificação da passagem. De acordo com a CP, o vandalismo e a falta de civismo de quem utiliza esta infra-estrutura contribui para que nem sempre se consigam garantir «boas condições de limpeza e manutenção apesar dos esforços que têm sido desenvolvidos para manter um serviço de qualidade». No entanto, alega a CP, é à REFER, enquanto «gestora da infra-estrutura ferroviária», que compete responder sobre o presente e futuro do túnel de Alcântara-Mar.

Mas também não foi na REFER que encontrámos respostas, pois segundo a empresa «a passagem subterrânea que serve a estação de Alcântara-Mar, por se constituir como acesso urbano entre os dois lados da via férrea, está sob jurisdição da autarquia, a quem cabe a responsabilidade da sua gestão e manutenção». Não obstante, a REFER garante que tem «feito chegar diversas comunicações» à CML, com o objectivo de repor «as condições de segurança e circulação do local».

Na CML é à Unidade de Intervenção Territorial Ocidental que cabe a responsabilidade de gerir e intervir nesta passagem subterrânea. Tentámos contactar directamente a direcção deste gabinete, com o objectivo de perceber se existe algum plano de reabilitação que inclua o túnel ou a zona envolvente – recorde-se que esteve em cima da mesa o Plano de Urbanização Alcântara XXI, um projecto polémico com assinatura do arquitecto Sua Key, e que entretanto não foi avante.

Contudo, a resposta chegou-nos através do Departamento de marca e Comunicação: «A Câmara Municipal de Lisboa identificou alguns problemas de segurança e salubridade na passagem pedonal subterrânea de Alcântara, tendo dado início a um conjunto de diferentes intervenções que ainda estão em curso. Entretanto, está em desenvolvimento um projecto global de requalificação daquela infra-estrutura». Faltam-nos pormenores sobre as intervenções que estão em curso. Mas as imagens, vindas das profundezas, falam por si.

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O odor a urina é uma constante nesta passagem utilizada pelos passageiros do comboio

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