Piscina da Penha de França, fechada há sete anos, assim continuará. Seguem-se os tribunais
A indefinição em torno do futuro da Piscina da Penha de França, encerrada desde 2011 para obras de reabilitação, intensifica-se. As divergências entre a Câmara de Municipal de Lisboa (CML) e o Centro Cultural e Desportivo (CCD) Estrelas de São João de Brito, colectividade a quem foram entregues a reabilitação e a exploração do equipamento, parecem insanáveis. A irredutibilidade de posições deixa adivinhar que ainda deverá passar muito tempo até que os moradores daquela zona da cidade venham, finalmente, a poder frequentar o equipamento, cuja abertura tem sido sucessivamente adiada. O recurso aos tribunais é uma forte possibilidade, o que poderá arrastar ainda mais o processo.
A câmara anunciou, esta semana, que rescindirá o contrato com o clube, se o resultado da auditoria por si pedida indicar uma gestão pouco correcta do dinheiro público. Mas a O Corvo, o presidente do clube, Nuno Lopes, que reclama o pagamento de uma verba de cerca de 250 mil euros “em falta” por parte da autarquia, fala em “má fé” e promete exigir o montante em tribunal. O dirigente critica também a demora na realização da referida auditoria e acena ainda com uma providência cautelar para travar a possível rescisão contratual – o que poderia fazer com que, avisa, a piscina apenas viesse a abrir daqui a “dois ou três anos”. Trata-se de mais uma etapa de um imbróglio que tem privado a comunidade do usufruto da única piscina pública naquela área da capital e provocado o definhar do Estrelas de São João de Brito.
O clube da freguesia de Alvalade assinou, em Julho de 2013, um protocolo com a Câmara Municipal de Lisboa para a reabilitação da velha infraestrutura e ainda a exploração da mesma para um período de cinco anos, entre 2015 e 2020. O contrato previa a transferência de 775 mil euros dos cofres do município para a colectividade, a fim de realizar os necessários trabalhos de requalificação do equipamento e de garantir o regular funcionamento durante aquele período. Só que os problemas começaram logo depois, com o Tribunal de Contas a obrigar a rever, em 2014, o contrato-programa inicialmente assinado entre CML e clube.
Os moradores da Penha de França deixaram de poder usar a piscina no início da década
A seguir a essa rectificação, surgiam complicações com o próprio desenvolvimento do projecto, levando a câmara a pedir ao clube que requacionasse alguns aspectos do mesmo. Já com quase três anos de indefinições, os trabalhos arrancaram, por fim, em Abril de 2016, com uma cerimónia na qual compareceu Fernando Medina. No momento, o presidente da câmara manifestou enorme satisfação pelo início dos trabalhos – “trata-se de um grande dia”, disse – e confessou-se esperançado na reabertura da piscina ainda naquele ano. Tanto que, em Setembro de 2016, chegaram a ser realizadas visitas com jornalistas ao equipamento quase terminado, e com o tanque cheio de água, antevendo a inauguração para breve.
Mas a expectativa veio a revelar-se um logro. Entrou-se em 2017 sem que a piscina abrisse, apesar das promessas e mesmo com muita gente já inscrita nas aulas de natação, tendo para tal pago as suas quotizações. Em Março desse ano, a Junta de Freguesia da Penha de França anunciava, através de comunicado, que cortava os pagamentos da água, da electricidade e do gás ao clube, com os quais se havia comprometido. Em causa estava o que a junta considerou, na altura, ser o incumprimento da associação da data-limite para a abertura ao público da piscina. Tudo porque a obra teria vários defeitos, entre os quais infiltrações na cuba da infra-estrutura, impossibilitando assim a sua utilização. “Tornou-se, assim, evidente que o clube não assegurou uma adequada fiscalização da obra, tarefa que o contrato-programa lhe atribuiu”, acusava a junta, naquela altura.
Chegava assim ao conhecimento do público a existência de um diferendo entre a dona da obra, o Estrelas de São João de Brito, e a empresa por si contratada, a Tanagra. O qual se mantém, passado ano e meio. Devido aos problemas técnicos detectados na piscina, o clube recusa-se a pagar à construtura o valor em dívida, 260 mil euros, enquanto aquela não os assumir e corrigir. “Há trabalhos que estão pagos e que foram mal feitos”, diz agora a O Corvo o presidente do Estrelas, Nuno Lopes – que também se tem vindo a queixar de ter sido “enganado” pela Câmara de Lisboa, por esta ter congelado a transferência das verbas contratualizadas e por não ter feito atempadamente a vistoria que prometera em Novembro de 2017. “São eles os responsáveis pela situação em que nos encontramos. Têm actuado de má fé e faltado à verdade”, acusa.
As palavras do dirigente surgem como reacção às declarações do vice-presidente da autarquia, Duarte Cordeiro (PS), feitas na reunião pública de vereação desta quarta-feira (25 de Julho), durante a qual responsabilizou o clube pela situação em que se encontra. Mais, o autarca justificou a cessação das transferências das verbas dos cofres municipais para a colectividade com as “discrepâncias encontradas” nesses movimentos, consideradas suficientes para justificar a realização de uma auditoria. Apesar de serem “dúvidas fundadas”, relacionadas com a realização de “trabalhos a mais”, o autarca diz que prefere esperar pelo final da auditoria para tomar uma decisão sobre esta matéria. Mas avisa já que não está afastada a possibilidade de rescisão do contrato, assumindo a CML a responsabilidade de terminar a obra, se tal cenário se confirmar.
Duarte Cordeiro respondia à interpelação sobre esta matéria do vereador João Gonçalves Pereira (CDS-PP), o qual alertava para a asfixia financeira vivida pelo clube devido a este caso. E perante a insistência do eleito centrista, o vice-presidente não apenas reiterou a necessidade de se aguardar pelo resultado da perícia técnica e financeira pedida pela câmara, como afastou qualquer responsabilidade da CML pela situação de impasse na Piscina da Penha de França e na vida do clube. “Adiantámos apoios ao clube, por solicitação do mesmo. Não lhes devemos nada. Por contrato, eles sabem desde o início que era sua a responsabilidade por trabalhos a mais na obra. E estes apenas fazem sentido para garantir a continuidade da obra”, explicou o vice-presidente, assegurando que a alternativa será a rescisão contratual com o Estrelas de São João de Brito.
Confrontado com estas declarações, Nuno Lopes assevera que a autarquia está a agir de “má fé” e a “faltar à verdade”. E promete uma guerra judicial sem quartel para defender os interesses do clube. “Até parece que nos estão a fazer um favor. Não há trabalhos a mais, como a câmara alega, estão a inventar um problema que não existe. Se tinham desconfianças em relação às verbas, por que é que não falaram connosco? Na verdade, estão, estranhamente, a arranjar argumentos para defender o empreiteiro, com o qual temos um outro diferendo”, afirma o dirigente do Estrelas de São João de Brito. O responsável diz ainda que a figura de “trabalhos a mais” estará a ser incorrectamente usada pela câmara. Do que se tratará afinal, alega, são “custos imprevistos”. “Temos isto tudo documentado, há relatórios, os autos foram aprovados”, diz.