Câmara de Lisboa entrega 630 casas a duas mil pessoas até Março de 2019

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Sofia Cristino

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URBANISMO

Cidade de Lisboa

17 Julho, 2018

“Foi aqui que cresci, regressei às origens. Melhor do que estar nesta casa, só no céu”, diz, de sorriso nos lábios, Maria Francisco, 58 anos, a primeira moradora a receber as chaves de uma das cem casas requalificadas pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) no âmbito do programa municipal “Habitar o Centro Histórico”. A entrega das casas começou, na manhã desta terça-feira (17 de Julho), no Bairro do Castelo, seguindo por Alfama e terminando na Mouraria. “O tecto da minha antiga casa caiu-me aos pés e fui expulsa para o senhorio fazer obras. Propôs-me eu ficar pagar 825 euros de renda, mas ganho o salário mínimo. Não esperava que fosse tão desumano. Foram meses muito difíceis, tinha pesadelos e trabalhava a chorar. Há muita gente à espera de casa, a maioria da cidade está a sofrer bullying imobiliário”, conta Maria Francisco, que se viu obrigada a viver com uma amiga enquanto esperava pela casa municipal. Ao longo desta terça-feira, mais 52 famílias ficam a conhecer nova morada, depois de terem sido despejadas, ou estarem em risco de despejo, das suas antigas habitações.

“Entregamos logo as casas que cumpriam com os requisitos todos, porque não queríamos fazer esperar as pessoas em situação mais vulnerável. Agora, estamos a fazer a avaliação das candidaturas nas quais ainda temos dúvidas, porque não cumprem os critérios exigidos no concurso. Queremos deixar o mínimo de pessoas possível de fora. Assim que as candidaturas forem validadas, avançamos com o processo de afectação”, explica a vereadora da Habitação, Paula Marques, salientando, novamente, que está a ser estudada a possibilidade de o programa ser estendido a outras freguesias. “Muito mais faltará fazer além do que foi feito hoje, mas estamos aqui para pôr o património municipal ao dispor das famílias”, garantiu a vereadora, numa cerimónia onde também marcou presença Fernando Medina, o presidente da autarquia.

 

O primeiro concurso do “Habitar o Centro Histórico” recebeu 110 candidaturas de moradores das freguesias de Santo António, São Vicente, Misericórdia e Santa Maria Maior. Dez pessoas ficarão de fora, uma vez que, nesta primeira fase, serão entregues apenas cem fogos do património municipal, agora requalificados, num investimento total de 2 milhões e meio de euros. O programa municipal nasceu para dar resposta à pressão imobiliária sentida, nestas quatro freguesias, desde a entrada em vigor da “lei das rendas”, mas também devido ao crescimento do turismo, disponibilizando casas aos moradores do centro histórico em risco comprovado de perda de habitação.

O presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, avança que, até Março de 2019, a autarquia atribuirá 630 casas, antes mesmo de estarem prontas. Neste número estarão já incluídas as 100 habitações do programa “Habitar o Centro Histórico”, mas também as fracções dos programas de arrendamento acessível para as classes médias e jovens, de arrendamento social e habitação construída no Bairro Padre Cruz e no Bairro da Boavista. Até Setembro, as famílias terão a possibilidade de conhecer a nova casa, mesmo que só em projecto, uma forma também de garantir “uma maior tranquilidade e segurança” a quem receia perder a actual residência.

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António Melo, um dos felizes contemplados com uma habitação municipal no centro histórico

“A família sabe que aquela casa vai ser sua e pode acompanhar a obra que está a ser feita. As 630 casas ou já estão reabilitadas ou estão em obras ou em início de obra. E a última empreitada será realizada no primeiro trimestre de 2019. Queremos que tenham a segurança de saber que vão ter um tecto”, explica Medina. Esta segunda-feira, 16 de Julho, a autarquia celebrou um acordo com a Segurança Social para a reutilização de cerca de 250 fogos para famílias da classe média e estudantes do ensino superior.


 

“A Câmara está a construir nova habitação e a construir através de parcerias com privados centenas de fogos que vão ser recolocados no mercado, o que não fazia há muito tempo. Podem pensar que 630 casas é pouco, face à dimensão de problemas da cidade, mas isto significa habitação para quase 2 mil pessoas”, esclarece.

 

O autarca lembra ainda a importância de se corrigir “um problema que exige mudanças na lei”.  “Não há que poupar nas palavras, vivemos uma grave crise da habitação, há muito poucas casas disponíveis e as que há são casas a preços muito elevados. Esta situação reclama por respostas urgentes e é, por isso, que temos colocado toda a pressão na iniciativa legislativa do parlamento”, afirma. Medina diz que só a alteração ao enquadramento do arrendamento ao nível do código civil e do regime fiscal do arrendamento de longa duração irão permitir “dar um impulso significativo na disponibilização de habitação no mercado na cidade”. “Não tenhamos ilusões, a retracção do mercado foi tão significativa que só recuperando alguma normalidade e aumentando as condições para que haja mais casas privadas no mercado conseguiremos dar uma resposta na escala necessária ao problema”, considera.

 

Medina sugere que a lei seja mudada no sentido de “criar incentivos para que mais proprietários coloquem as suas casas em regime de contratos de longa duração”. “Queremos que a casa seja um elemento de estabilidade para a vida, sem essa estabilidade não será possível ninguém organizar bem a sua vida”, diz.

 

 

Esta manhã, António Melo, Carla Cunha, Luís Santos e Maria Rosa receberam nova habitação nas freguesias de Santa Maria Maior e de São Vicente, onde já viviam. António Melo, 72 anos, tal como O Corvo noticiou a 17 de Novembro de 2017, morava no Beco da Lapa e, desde 2016, depois de ter sido despejado, tinha de estar fora de casa, durante o dia, por causa do ruído ensurdecedor das obras do andar de cima, na sua antiga casa. Agora vai viver na Calçada de São Vicente, duas ruas acima. Carla Cunha, 39 anos, vivia num T0, no Pátio do Carrasco, com as duas filhas menores e o marido, quando, em Abril de 2017, foi informada pelo senhorio que não lhe seria renovado o contrato, alegando precisar de realizar “obras profundas”. Hoje, recebeu uma nova casa, com vista para o rio Tejo e a poucos metros do Miradouro de Santa Luzia, depois de viver numa “casa de emergência”, em Marvila. Luís Santos, 55 anos, ia ser despejado em Novembro de 2018, mas já tem casa nova, na Rua da Achada, na Mouraria. Quando lhe é entregue o contrato, diz ainda não acreditar. “Estou surpreendido, nunca esperei conseguir uma casa nova”, comenta, emocionado, o morador na Mouraria há 15 anos.

 

No final da entrega das primeiras chaves, questionada ainda sobre quantas casas devolutas tem, afinal, a Câmara de Lisboa, Paula Marques garante que a autarquia conhece o património municipal, mas ainda não quer avançar com números concretos, porque há casas municipais que provavelmente serão demolidas, dado o seu estado de degradação. “Não faz sentido casas completamente degradadas serem incluídas no conjunto de habitações passíveis de requalificações pela autarquia. Há dez anos, o património municipal não estava sequer cadastrado, estamos a fazer um levantamento para perceber quais os fogos que podem ser reabilitados. Há património que está no cadastro, mas não tem viabilidade e tem de ser demolido. O levantamento é a análise daquilo que é viável e do que não é, tendo de ser demolido e abatido ao cadastro”, esclarece.

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