Deve o centro de Lisboa ser considerado como uma zona de “rotação populacional”?

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Samuel Alemão

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URBANISMO

Cidade de Lisboa

30 Janeiro, 2018


O reconhecimento do centro histórico de Lisboa e das áreas envolventes como territórios onde a pressão turística é um dado irrevogável poderá levar a que se passe a ver o fenómeno de outra forma. Ao ponto de, apesar de se tentar manter a população local nos “bairros típicos” da capital, se começar a assumir algumas dessas áreas como sendo de “rotação populacional”. Sítios, como na Baixa Pombalina, onde os mais jovens podem querer morar, em determinada fase da sua vida, mas que depois abandonam em busca de maior conforto, dando lugar à geração seguinte. Aceitando tal realidade, ter-se-ia que definir uma estratégia e um quadro legal. Seria uma forma de melhor lidar com a pressão causada pela busca de habitação, a preços aceitáveis, conjugada com o turismo de massas, no coração da cidade, defende Luís Newton (PSD), presidente da Junta da Freguesia da Estrela.

“Temos de reconhecer que a cidade de Lisboa tal como a conhecíamos nos anos 80 ou 90 já não vai voltar. O turismo veio para ficar e temos de estar preparados para lidar com ele, protegendo os habitantes das áreas mais procuradas”, considera o autarca, no dia (terça-feira, 30 de janeiro) em que a Assembleia Municipal de Lisboa (AML) realiza um debate temático sobre o Alojamento Local (AL), solicitado pelos social-democratas. “A rotação populacional, sobretudo nesses locais, é algo normal e natural e que, por isso, devemos conseguir antecipar. Estes serão, cada vez mais, territórios com características rotativas. Olhando para a experiência de muita gente, é natural que um jovem queira viver numa casa pequena no centro, aceitando limitações como a falta de espaço ou a falta de certas comodidades. Como também o será que, a partir de certo momento, pretenda mudar”, por querer outras coisas, como casa com garagem ou com recolha centralizada de lixo, diz Luís Newton a O Corvo.

Aceitando tal realidade como uma inevitabilidade, o presidente da Junta da Estrela alerta para a necessidade de a capital se preparar, reconhecendo haver matérias em que a “inexistência de legislação adequada do AL causa problemas”. Apesar de não se querer intrometer nos modelos de negócio de empresas como a AirBnB, admite a necessidade de uma regulação mais eficaz, adequada às dinâmicas muito fluídas do sector e dos novos estilos de vida urbana. “Temos de proteger o território e dar oportunidades para que os jovens de hoje possam ter a possibilidade de escolher morar nesse mesmo território, da mesma forma como os mais velhos o fizeram noutra altura”, diz. “São, cada vez mais, zonas com uma grande dimensão de rotatividade, mas temos de ter a capacidade de fixar ali população, por certos períodos de tempo, os quais poderão obedecer a ciclos compreendidos entre cinco e dez anos”, advoga. Caso contrário, a desvitalização populacional do centro histórico será um problema crescente.

O líder da bancada dos deputados do PSD na Assembleia Municipal de Lisboa – que espera do debate desta terça-feira uma “clarificação dos partidos e da cidade” em relação ao alojamento local, para além daquela que tem sido a posição oficial da Câmara Municipal de Lisboa – defende a criação de “territórios estratégicos” na capital, como forma de os proteger do avanço desenfreado da actividade turística. Algo que, no fundo, vai de encontro às quotas de AL por bairros, preconizada por PS e BE. “De uma forma geral, há uma percepção alargada das vantagens trazidas pela actividade turística, mas também dos problemas que ela traz. Todos queremos que se mantenha esta actividade, como forma de captação da riqueza, mas não às expensas das pessoas que vivem nos locais mais procurados pelos visitantes”, defende o autarca social-democrata, admitindo, porém, alguma dificuldade do seu partido em “fazer passar a mensagem” sobre o que realmente pensa sobre esta matéria.

E é aí que a definição dos “territórios estratégicos”, defendida pelo PSD, assume especial importância. Se se realizar um meticuloso trabalho de mapeamento dos impactos do turismo nos vários bairros da capital, ou do “potencial de concentração turística” – como lhe prefere chamar -, tendo em conta factores como a “incidência directa” do fenómeno ou a “acessibilidade” dos visitantes a essas zonas, será possível ter uma abordagem mais eficaz às vicissitudes associadas. Luís Newton dá o exemplo da Madragoa, situada na sua freguesia e “muitas vezes esquecida”, quando se fala nos impactos do turismo nos bairros típicos. Se se limitar ali a actividade do Alojamento Local, defende o edil laranja, o bairro só tem a ganhar, porque, “antes de mais, valoriza o próprio investimento, mas também porque ajuda a fixar população e impede que os turistas se cruzem com mais turistas”.

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