Apesar de planeada há anos, construção de uma biblioteca municipal “a sério” em Benfica continua sem data definida

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Kátia Catulo

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Benfica

11 Fevereiro, 2019

É um desejo antigo da população de uma das mais populosas freguesias de Lisboa e até tem sido alvo de sucessivas promessas de concretização. Mas ainda tudo está em aberto. A construção da Biblioteca Municipal de Benfica deverá continuar a arrastar-se no tempo e, neste momento, nem é certo que o investimento se venha a realizar nos próximos anos. É a própria Câmara Municipal de Lisboa (CML) quem o assume agora. Até porque está ainda por definir qual a melhor solução para aquele bairro: aproveitar as instalações do Estado anexas ao Palácio Baldaya, o centro cultural da freguesia inaugurado em 2017, ou construir um equipamento de raiz no espaço da urbanização em curso no recinto da antiga Fábrica Simões, como há anos se prevê. Tanto a junta de freguesia como a câmara parecem ainda indecisas sobre a opção certa. O dilema ficou patente na  última reunião pública descentralizada da vereação, na passada semana (quarta-feira, 6 de Fevereiro), em Benfica, onde quase todos os partidos reconheceram a inequívoca necessidade do equipamento.

A possibilidade de utilização como espaço de acolhimento da biblioteca dos edifícios da administração central fronteiros ao reabilitado Palácio Baldaya foi avançada pelo presidente da CML, Fernando Medina, nessa reunião, depois de confrontado por uma munícipe com o eterno adiamento do projecto. Salientando que a abertura do palácio como centro cultural trouxe “uma nova realidade, anterior à promessa de construção da biblioteca na Fábrica Simões”, o autarca confessou ver com bons olhos o aproveitamento para esse fim dos imóveis do antigo Laboratório Nacional de Investigação Veterinária (LNIV) – entidade que saiu em 2013 de um complexo de edifícios do qual fazia parte o palácio, utilizado pela instituição durante um século (desde 1913). Logo no ano seguinte, em 2014, a câmara assinou com a empresa pública Estamo – encarregue da alienação do património imobiliário do Estado – um contrato de comodato, por 50 anos, para que a Junta de Freguesia de Benfica pudesse reabilitar o palácio e nele criar um centro cultural.

Agora, e perante o sucesso inequívoco do Palácio Baldaya como casa da cultura daquela freguesia, Medina sugere que os pavilhões desocupados  situados mesmo ao lado alberguem a biblioteca. “Temos de aproveitar o facto de a junta ter feito um excelente trabalho relativamente ao Palácio Baldaya. Além disso, o projecto da biblioteca de Benfica é prévio à junta ter tomado conta do palácio”, salientou o autarca, depois de uma munícipe, Joana Grilo, se ter mostrado insatisfeita com a resposta da vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto, ao reconhecer não estar nos planos da CML avançar-se, nos próximos anos, com a construção de uma biblioteca municipal em Benfica. Lembrando que o palácio tem uma biblioteca – inaugurada há um ano –, Vaz Pinto disse que tal equipamento, “no curto prazo, pode responder às necessidades”. Cenário que não agrada a Joana Grilo, para quem tal solução “é um tapa-buracos”. Tal observação levou Fernando Medina a avançar com uma possibilidade “mais rápida” de criação de uma grande biblioteca naquela zona da cidade. Mas a presidente da junta, Inês Drummond (PS), não afasta ainda a hipótese dela vir a surgir na antiga Fábrica Simões – embora com outras valências.

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Desde a sua inauguração, no Verão de 2017, o Palácio Baldaya tem-se assumido como o principal pólo cultural de Benfica

A utilização de parte da antiga unidade fabril têxtil – encerrada em 1987, após anos de incerteza – como casa da futura Biblioteca Municipal de Benfica, integrada na Rede Municipal de Bibliotecas de Lisboa (BLX), é uma promessa com quase uma década. A cedência de um espaço para a construção de um equipamento cultural de uso colectivo – incluindo biblioteca – faz parte, aliás, do conjunto de contrapartidas relativas à construção do grande empreendimento imobiliário aprovado para aquele lugar, em Julho de 2011. Uma solução surgida depois de, alguns anos antes, em 2006, o anúncio do loteamento do empreendimento Villa Simões, naquele sítio, ter causado polémica junto de parte da população e do movimento associativo, devido ao volume de construção então previsto. A possibilidade de ali se fazer construção nova fora autorizada em 1997, com a aprovação do Plano de Pormenor do Eixo Luz Benfica.


 

A revisão do projecto, no início desta década, foi então acompanhada pela inclusão da referida contrapartida. Desde então, assumiu-se que aquela seria a localização da nova Biblioteca Municipal de Benfica. Algo confirmado pelo programa municipal Bibliotecas XXI, apresentado pela vereadora Catarina Vaz Pinto e aprovado pela Câmara Municipal de Lisboa, em Maio de 2012. Nele se previa dotar a capital portuguesa, até 2024, de oito-bibliotecas âncora e 18 bibliotecas de bairro, duplicando o número desses equipamentos então existente. Entre as pertencentes à primeira categoria contava-se a biblioteca de Benfica, a construir no espaço da antiga Fábrica Simões, referia o documento. Seria apenas necessário aguardar pelo início do investimento imobiliário. Depois de ter estado congelado durante vários anos – o que até permitiu o funcionamento de um pólo criativo naquele recinto -, o projecto da Teixeira Duarte começou a tomar forma no Outono passado, agora sob a designação Fábrica 1921.

 

Foi essa promessa antiga que recordou a referida munícipe na reunião descentralizada da vereação da semana passada. Afinal, as obras na antiga Fábrica Simões até já começaram, mas nada se sabe sobre o equipamento cultural para ali previsto. “Não se entende como é que não existe uma biblioteca municipal numa freguesia com 47 mil habitantes, numa capital europeia. Na última reunião descentralizada em que cá vim, disseram que a biblioteca municipal estava planeada e aguardava o início das obras na Fábrica Simões”, salientou Joana Grilo, uma das responsáveis pelo Com Calma, espaço associativo e cultural a funcionar, desde Setembro de 2015, na Rua República da Bolívia – reivindicando esta instituição ter sido a criadora da primeira biblioteca informal da freguesia, com 3.000 títulos catalogado e prontos a ser requisitados.

 

Antiga Fábrica Simões é apontada, desde o início da década, como o local da futura biblioteca

 

Ante o reconhecimento pela vereadora de que, apesar de prevista, Biblioteca Municipal de Benfica não tem data de concretização, a dirigente associativa insistiu. E lembrou que até fora desincentivada a apresentar uma proposta específica ao Orçamento Participativo (OP) de Lisboa, porque lhe havia sido garantido que até 2021 seria criada a prometida biblioteca municipal. E não se deu por convencida com o acenar da pequena biblioteca do Palácio Baldaya como alternativa. “É um tapa-buracos. Precisamos de uma escala e de uma reposta maior do que a que existe com a biblioteca do palácio”, proferiu, lembrando as reiteradas promessas de prossecução do projecto, considerado essencial para uma freguesia com 32 instituições escolares. Um argumento, na verdade, já utilizado em anos anterior pela presidente da Junta de Freguesia de Benfica.

 

Foi depois dessa intervenção de Joana Grilo que o presidente da câmara indicou que o município estaria aberto a criar uma alternativa que ajudasse a responder a tais necessidades. Se, num primeiro momento, ainda referiu os méritos do Palácio Baldaya como equipamento cultural de excelência, a insistência daquela cidadã na necessidade de não deixar cair o projecto da biblioteca municipal levou-o a avançar com um novo cenário. “Há aqui dois caminhos. Um é tomar uma decisão sobre uma nova infra-estrutura, que será sempre longo o tempo da sua concretização. A outra hipótese, que é a que gosto mais, é a de, trabalhando em conjunto com a junta de freguesia, aproveitarmos o Palácio Baldaya e as construções de grande dimensão ali existentes”, disse Fernando Medina, salientando tratar-se de uma “área significativa que ainda está na posse do Estado”. O autarca afirmou que veria como possível a sua transição para a tutela do município ou da freguesia, para aí, “com muito mais rapidez, se poder construir mais equipamentos culturais, entre os quais uma biblioteca com escala”. “Esse é o caminho mais rápido”, frisou.

 

Grande parte das instalações do antigo Laboratório Nacional de Investigação Veterinária continua sem uso definido

 

Um cenário que não desagradará à presidente da junta, admitiu a própria, mas que não estará no topo das suas prioridades. “A nossa proposta vai no sentido de que o equipamento previsto para a Fábrica Simões, no âmbito das contrapartidas, possa não apenas ser alocado a uma biblioteca municipal, mas a uma coisa mais ampla, permitindo ter uma zona de estudo, biblioteca e salas de ensaio”, afirmou, após ter alertado para o crescimento das necessidades neste campo. “Vamos passar a ter 22 mil estudantes na freguesia, depois da vinda para aqui do ISCAL (Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa) e da Escola Superior de Dança.

 

No final da reunião descentralizada, foram vários os vereadores que se pronunciaram sobre este assunto, tendo PCP, Bloco de Esquerda e PSD reivindicado também como sua a ideia da construção da biblioteca de Benfica. “Há muitos anos que nos batemos por isso, quer na freguesia quer na câmara”, referiu o comunista João Ferreira, que, ficando a saber ali da sugestão de Medina para a utilização dos edifícios abandonados do laboratório veterinário, defendeu uma célere tomada de posição da câmara. “É necessário ter iniciativa rapidamente, sob pena de que, com o correr do tempo, se comprometa esta solução”, sugeriu.

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