Câmara de Lisboa prepara fim à venda de bebidas em copos de plástico descartáveis
A cidade de Lisboa deverá adoptar, durante os próximos anos, um conjunto de medidas restritivas da utilização de copos de plástico descartáveis para a venda de bebidas em estabelecimentos comerciais, a fim de aliviar as suas actuais pesadas consequências ambientais. Mais, as formas de conseguir atingir o objectivo de erradicar, a médio prazo, o uso destes recipientes na capital estão já a ser discutidas entre a autarquia e o Governo. A estratégia, que se inscreve na tendência internacional de progressiva redução e eliminação do uso de embalagens descartáveis fabricadas com este componente, foi confirmada a O Corvo por uma fonte do gabinete do vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Duarte Cordeiro, que tutela o pelouro da higiene urbana.
A decisão dá seguimento a uma recomendação aprovada, em 17 de novembro passado, na Assembleia Municipal de Lisboa (AML), na qual não apenas se solicita à câmara municipal que elabore um plano para a redução do plástico para a capital, mas também se pede à Assembleia da República (AR) que legisle a proibição da utilização de copos de plástico descartáveis nos estabelecimentos comerciais. Da autoria dos deputados municipais independentes Patrícia Gonçalves e Paulo Muacho e elogiada pela associação ambientalista Quercus, a proposta lembra que no programa de governo da capital, apresentado nas últimas autárquicas da coligação encabeçada por Fernando Medina, “consta o compromisso de executar um plano para a redução de plástico utilizado e desperdiçado na cidade de Lisboa”.
O documento – que contou apenas com a abstenção do PPM e do MPT em ambos os pontos, mas também com a do CDS-PP no referente ao pedido à AR para que altere a legislação – lembra que “plásticos à base de petróleo, que estão entre os resíduos mais comuns, são um elemento tóxico que entra na cadeia alimentar através dos microplásticos, podendo provocar efeitos nefastos nos alimentos, nos animais e nos seres humanos” e salienta o facto de países como a França terem já leis no sentido da eliminação de todos os utensílios de plástico como copos, pratos e talheres até 2020. “Em Portugal a imposição de custos na venda de sacos de plástico resultou, positivamente, na diminuição drástica da sua utilização e na substituição generalizada por sacos de papel”, refere-se ainda, sem se deixar de notar que está ainda por votar o projecto lei do Partido Ecologista “Os Verdes”, apresentado em julho de 2017, para “interditar a comercialização de utensílios de refeição descartáveis em plástico”.
A recomendação destaca o facto de em diversos locais da capital com espaços de diversão nocturna, como Santos, Jardim do Arco do Cego, Santa Catarina (Adamastor) e Bairro Alto, “ser frequente a produção massiva de lixo, que consiste essencialmente em copos de plástico”, o qual “não é na sua maioria reciclado, é levado para aterros, implicando um custo elevado para o Município de Lisboa, quer em termos ambientais, quer em termos financeiros com os custos associados à sua recolha e deposição em aterro”. O documento aprovado pela AML considera ainda que “a utilização de copos de plástico pelos estabelecimentos de diversão nocturna como bares e discotecas consiste numa transferência do risco ambiental da esfera destes privados para a esfera pública, pois a utilização de copos descartáveis reduz os custos da actividade, reduzindo simultaneamente o valor arrecadado em sede de Taxa de Resíduos (calculada em função do consumo de água)”.
Questionada por O Corvo sobre a forma como pensa acatar tal recomendação, a Câmara de Lisboa recorda que “tem, desde 2016, um Plano Municipal de Gestão de Resíduos com o horizonte até ao ano de 2020 e que prevê, neste período de tempo, e de forma integrada, a redução de produção de resíduos em 10%”. Uma mitigação, salienta em resposta escrita uma fonte do gabinete do vice-presidente, Duarte Cordeiro, “que se pretende não só no que diz respeito ao segmento plásticos/embalagens, mas também em todos os outros segmentos valorizáveis ou não”.
A meta é ambiciosa, admite a mesma fonte, mas alcançável com a “participação de toda a comunidade”. Por isso, foi já constituído pela CML o Conselho Consultivo para a Prevenção e Redução de Resíduos, onde se sentam agentes tão distintos como os principais operadores do sector, hotelaria, restauração, turismo, investigação científica, associações de comerciantes e de moradores. No âmbito deste conselho consultivo, explica, serão estabelecidos programas de acção que conduzam à referida redução até 2020. Mas há já trabalho concreto a ser feito sobre os copos de plástico, pois “o município de Lisboa encontra-se já a trabalhar com o Governo de forma a encontrar soluções que possam levar ao abandono desta solução para venda de líquidos na cidade”.
Uma medida que deverá agradar à associação ambientalista Quercus, embora a mesma defenda a adopção de uma gradual política de redução do uso do plástico. “Não deve ser feita uma redução tão radical, de um momento para o outro. Achamos que deverá existir um momento de transição, isso é importante para que as pessoas se adaptem e a medida seja mais eficaz. Mas, num futuro próximo, será desejável a proibição total, claro”, disse a O Corvo a responsável pelo grupo de trabalho dos resíduos da Quercus, Carmen Lima, ainda antes de existir a confirmação de que a CML estaria a trabalhar no sentido da erradicação do uso dos copos de plástico.
A representante da associação ambientalista lembra a existência de uma tendência mundial de redução de materiais descartáveis, o que se revela um desafio de enorme proporção, admite, uma vez que “se tratam de produtos muito baratos”. Carmen Lima avalia, por isso, como muito positiva a iniciativa da Assembleia Municipal de Lisboa, por ir na direcção certa do estímulo à redução da utilização de tais materiais. A ecologista enfatiza que a associação que representa apresentou, também em novembro passado, uma proposta ao Governo para o aumento do IVA para os recipientes descartáveis em simultâneo com a redução dos reutilizáveis.
Ainda na semana passada, O Corvo dava conta da contestação por parte de um grupo de moradores da zona do Bairro do Arco do Cego ao lixo produzido – para além do ruído – por agrupamentos de jovens que se concentram junto a um estabelecimento que vende cerveja a preços reduzidos. A Junta de Freguesia do Areeiro diz que tem de recolher centenas de copos de plástico, quase todos os dias. Uma das proposta da petição dos residentes na área, entregue na Assembleia Municipal de Lisboa para denunciar a situação – e promovida pelos colectivos Vizinhos do Areeiro e Vizinhos das Avenidas Novas – é da introdução de um sistema de bonificação de a quem devolva dez copos utilizados. Uma medida defendida também pela Quercus. “A introdução de um sistema de caução tem funcionado bem, há experiências positivas em festivais de música”, afirma Carmen Lima.