Escola Básica Nuno Gonçalves, na Penha de França, reclama obras com urgência

REPORTAGEM
Samuel Alemão

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VIDA NA CIDADE

Penha de França

30 Maio, 2017




Os pais dos alunos temem que o mau estado de conservação das coberturas em amianto em dois locais do estabelecimento ponha em causa a saúde dos filhos, bem como a de funcionários e de professores. Um estudo da DECO, de 2014, aconselhava a retirada imediata desse revestimento. Mas a directora da escola, descansada por uma avaliação pedida na altura ao Instituto Ricardo Jorge, prefere sublinhar a necessidade urgente de obras de reabilitação. “As condições em que a escola funciona são muito mais preocupantes”, diz. Um ambicioso plano da Parque Escolar para uma requalificação profunda está suspenso desde 2011. O recurso aos remendos vai, por isso, disfarçando tal necessidade. Mas “não é aceitável” que se continue a usar indefinidamente tal expediente, diz a responsável.

Olhar para as projecções com a proposta de intervenção, concebida em 2011 pela Parque Escolar, para a reabilitação da Escola Básica 2/3 Nuno Gonçalves, situada na Penha de França, e confrontá-las com o que existe é como despertar de um sonho e contemplar a realidade. O traço ambicioso da arquitectura contemporânea proposto para a grande operação de renovação do estabelecimento construído em 1952 ficou para trás, como uma miragem. No caso, foi a necessidade de cortes na despesa, imposta pelas circunstâncias económico-financeiras do país à época e a chegada da troika, a ditar o congelamento do plano. Passados seis anos, revela-se evidente a urgência de obras num estabelecimento cuja “infraestrutura não dá já resposta às necessidades”, nem oferece garantias de que se possam desenvolver “medidas promotoras de sucesso escolar” , segundo a directora, Laurinda Pereira.

Com 700 alunos em regime diurno, mais três centenas à noite, a escola tem uma vasta lista de problemas, o mais evidente dos quais é a desadequação para os desafios e exigências educativos do presente de um edifício construído a meio do século passado, e sem ter sido alvo de melhorias substanciais. A dúzia de salas de aula revela-se insuficiente para as necessidades lectivas e não existem laboratórios de física e química actualizados. Os sinais de degradação e desgaste, naturais num equipamento com mais de seis décadas, vão-se acumulando. Há infiltrações na placa e a parede da fachada está a ser monitorizada por apresentar sinais de ligeira deslocação. Existem ainda duas coberturas de fibrocimento que estão a preocupar os pais dos alunos. A saúde dos filhos, bem como dos funcionários e professores, está em risco, dizem.

Por isso, pedem uma intervenção urgente do Ministério da Educação. “Expor um profissional a estas condições, que sabemos serem altamente nocivas para a saúde, não é admissível. Expor as crianças é ainda mais inadmissível. Acho, por isso, que todos devemos estar preocupados com o que isto”, diz a O Corvo Vasco Montez, pai de uma aluna do 6º ano e presidente da Associação de Pais do Agrupamento de Escolas Nuno Gonçalves. Já Rita Ponce, mãe de uma criança que estuda no 5º ano, lembra que “a utilização do amianto está proibida em Portugal desde 2005, pelo que não faz sentido continuar a expor crianças, professores e funcionários”. O aparente abandono do projecto de requalificação desenhado pela Parque Escolar deixou em suspenso a remoção do revestimento indesejado.

A alternativa à não realização de obras de fundo tem sido pequenas reparações, com a colocação de tela nos pontos onde o revestimento apresenta sinais de maior desgaste. Mas a soluções está longe de agradar aos encarregados de educação. “Acho que todos devemos estar preocupados com isto”, salienta Vasco Montez. A apreensão aumentou, nos últimos meses, quando, em fevereiro deste ano, as notícias dando conta de um investimento de 200 milhões de euros para a reparação de duas centenas de estabelecimentos de ensino não pareciam incluir a Escola Básica Nuno Gonçalves. “Ouvimos falar de dinheiro libertado para a requalificação de escolas, mas nunca ouvi qualquer referência à Nuno Gonçalves”, lamenta Rita Ponce, replicando as queixas feitas numa carta redigida pelos pais, a qual, após recolha de assinaturas, planeiam  enviar à secretária de Estado da Educação, Alexandra Leitão.

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A urgência pedida à administração central para que informe sobre a “data prevista para o início das obras de requalificação e/ou remoção do amianto desta escola” deriva do aparente protelamento das obras, mas vem fundamentada por uma preocupação nascida há quase três anos. Foi a 24 de setembro de 2014, no início de um novo ano lectivo, que a comunicação social deu conta de um estudo da DECO em que se garantia ser a qualidade do ar má em 23 estabelecimentos e, pior que isso, em quatro deles haviam sido detectadas placas de amianto danificadas. Neste grupo, a quem a associação de consumidores recomendava a “remoção imediata” dessas placas, encontrava-se a Escola Básica Nuno Gonçalves. A nível nacional, existiam ainda outros nove estabelecimentos com revestimentos de fibrocimento, a quem era apenas aconselhada vigilância, por os mesmos aparentarem estar em bom estado de conservação.

O tempo passou e nada mudou na escola de Lisboa. A directora da Nuno Gonçalves também quer uma rápida resposta da administração central, mas desvaloriza os perigos de eventual contaminação por amianto. “As condições em que a escola funciona são muito mais preocupantes”, afirma Laurinda Pereira, descansada por um relatório de avaliação solicitado ao Instituto Ricardo Jorge, mal foram tornados públicos os dados do estudo da DECO. Nessa avaliação, que foi entregue à escola em março de 2015, e agora consultada por O Corvo, é dito que “não existem, aparentemente, fragilidades no material que apresenta no geral um bom estado de conservação”. Resultado da análise a 15 amostras em locais considerados representativos, conclui-se que “as zonas abrangidas pela cobertura de fibrocimento podem ser consideradas limpas no que respeita à contaminação por fibras”.

“Esta é, como é óbvio, uma matéria que nos preocupa a todos e era já conhecida pela Direcção Regional de Educação e pela Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, não constituindo novidade para ninguém”, acrescenta a directora, para quem o problema do amianto – estando sob vigilância – é apenas parte de uma preocupação maior. “Preocupa-me que a escola – que tem um papel importante na integração de diferentes comunidades, na educação não formal e na expressão artística – continue a funcionar com estas carências. Não temos sequer um auditório, um espaço utilizável pela comunidade. A requalificação há tanto aguardada tem de acontecer. Não é aceitável que, ano após ano, se continue a tapar remendos”, diz.

O Corvo questionou o Ministério da Educação sobre este assunto, a 18 de maio. “Existe alguma intervenção prevista para retirar a cobertura de amianto no estabelecimento? O ME prevê retomar o plano de reabilitação da escola desenhado pela Parque Escolar? Quando?”, eram as perguntas. Até à publicação deste artigo, contudo, não foi recebida resposta.

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