Nasceu um novo parque verde entre o Palácio Nacional da Ajuda e Monsanto
A relva que ladeia os caminhos foi agora mesmo plantada e deverá singrar durante a primavera, tal como as 429 árvores e os 1509 arbustos também colocados em toda a área norte do Corredor Verde do Rio Seco, inaugurada nesta terça-feira (21 de março). A vista sobre o casario do Alto da Ajuda, num primeiro plano, e, sobretudo, o Tejo e a Ponte 25 de Abril, lá mais ao fundo, ajudam a criar um quadro surpreendente nesta parte da zona ocidental de Lisboa, num local onde antes apenas se adivinhava potencial por entre uma paisagem bastante desarrumada. Ao fim de mais de década e meia de intervenções – a primeira ocorreu já em 2001 -, está concluído o projecto de criação de uma faixa de território verde renaturalizado e ordenado, com mais de 11 hectares e a atravessar a freguesia da Ajuda, entre o Parque Florestal de Monsanto, o Alto da Ajuda e a Rua Eduardo Bairrada.
O tormento de Fernanda Silva é tão persistente que ela conhece quase de cor os horários dos aviões que lhe sobrevoam a casa. “O pior de tudo é ao meio-dia, quando passa aí um Boeing enorme da Emirates Airlines ou por volta das 18h30, quando passa um da TAAG. O ruído é tão avassalador que as janelas até abanam”, conta a moradora de 34 anos da Avenida Columbano Bordalo Pinheiro, mãe de uma criança com um ano de idade. Ela reside na artéria que liga a Sete Rios à Praça de Espanha desde 2003 e não se lembra de alguma vez ter sentido algo assim. “Este ruído muito intenso causado pelos aviões começou a agravar-se há dois ou três anos e tem estado a piorar, de dia para dia, de forma absurda. Tem-se causado angústia e desânimo”, relata. E não está sozinha. “Toda a gente aqui se queixa”, assegura. Pode não ser toda a gente, mas será, por certo, considerável o número de pessoas que se têm sentido acossadas pelos sobrevoos em Lisboa.
Uma obra que José Sá Fernandes, vereador da Estrutura Verde, qualifica como de “importância fundamental”. Em declarações a O Corvo, após a cerimónia de inauguração desta fase final do parque, o autarca salientou o facto deste cenário conferir uma identidade nova a um “sítio que era completamente desqualificado e desarrumado”. Havia ali um grande baldio, que servia de local de pasto de cavalos pertencentes a alguns moradores do Bairro 2 de Maio, situado mesmo ao lado, bem como construções precárias, entre as quais estábulos e pombais. Com o projecto agora concluído, os terrenos e a ribeira que dá nome ao parque foram limpos, preservaram-se algumas árvores lá existentes, plantaram-se muitas mais e fizeram-se caminhos. Surgira ainda zonas de merendas e mobiliário urbano, construíram-se uma aldeia columbófila, hortas e um pequeno picadeiro.
“Criou-se um parque urbano com um bom enquadramento, ordenou-se a paisagem e, assim, é possível estabelecer uma ligação entre o Parque Florestal de Monsanto e o Palácio Nacional da Ajuda e o resto do Rio Seco”, diz o vereador, lembrando ainda a importância da integração do Bairro 2 de Maio neste plano de regularização paisagística – que desempenha ainda um papel determinante no ciclo da água, ao criar uma área naturalizada situada a jusante da futura bacia de retenção do Alto da Ajuda, também ontem apresentada. Este projecto, que deverá arrancar este ano, é anunciado pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) como “uma solução de base natural para controlo de cheias prevista no Plano de Drenagem” e que “vai contribuir para minimizar o impacto dos fenómenos climatéricos extremos nas zonas baixas na Ajuda e Belém”. Em conjunto com o novo parque, travará os sedimentos arrastados pelas chuvas.
Tal revela-se de grande importância num local, o Rio Seco, caracterizado “por ser um leito de uma ribeira com correntes torrenciais, em solos de calcário e granito”, como explicou a O Corvo João Castro, coordenador do gabinete de projecto da Estrutura Verde da CML. O responsável destaca a importância de se criar uma paisagem “mais naturalizada e orgânica” na parte Norte, coincidente com a última fase do projecto – integrado na Estrutura Verde Municipal -, por ser a zona onde se estabelece uma ligação com o Parque Florestal de Monsanto e onde a ribeira original não foi afectada por construção. Esta área começa junto ao Pólo Universitário da Ajuda e termina na denominada zona do Cruzeiro – onde há um conjunto de edifícios sem particular importância patrimonial, situado a algumas centenas de metros do Palácio Nacional da Ajuda, mas que os projectistas optaram por manter intactos. Na área Sul, junto ao geomonumento do Rio Seco, o curso de água tem o seu percurso encanado sob urbanizações.