Há lixo até ao tecto no átrio dos prédios em São Domingos de Benfica
Os moradores da Calçada da Palma de Baixo e da Rua das Laranjeiras, em São Domingos de Benfica, já não suportam o cheiro oriundo da acumulação de lixo no átrio de entrada dos prédios. Dizem que têm dificuldade em entrar nos edifícios, vendo-se obrigados a afastar o lixo para chegarem a casa e acederem à caixa de correio. A situação arrasta-se há cinco anos, desde que os ecopontos foram retirados da rua e instalados dentro dos prédios. “Estes edifícios não estão projectados para isto. Quase não se consegue entrar em alguns prédios. Em alguns, as portas nem abrem, com caixotes dos dois lados e nos degraus. Como é que um bombeiro entra numa urgência?”, pergunta uma moradora. Duas habitantes, descontentes com a falta de preocupação da autarquia com a higiene urbana, lançaram uma petição exigindo à Câmara Municipal de Lisboa (CML) contentores subterrâneos. Helena Roseta, presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, promete levá-la a debate. A Câmara de Lisboa avançou, entretanto, a O Corvo que já tomou conhecimento da petição e vai colocar, nas próximas semanas, um ecoponto subterrâneo na Calçada de Palma de Baixo. Assegura, ainda, que a situação de acumulação de lixo não põe em risco a saúde dos habitantes.
“Quando entro no meu prédio, roço com a roupa no lixo. Isto não é comportável, é nojento. Sente-se um cheiro nauseabundo…”, desabafa Paula Vieira, 51 anos, moradora da Calçada da Palma de Baixo, em São Domingos de Benfica. Paula vive na cave de um prédio antigo e está à janela para não sentir o odor proveniente do lixo que se acumulou, ao longo dos últimos dias, no átrio de entrada do edifício. O desagrado da habitante é partilhado por outros moradores da Rua das Laranjeiras, o que os levou a subscreveram uma petição na qual exigem à Câmara Municipal de Lisboa (CML) uma intervenção urgente e a colocação de contentores subterrâneos no bairro. Helena Roseta, presidente da Assembleia Municipal de Lisboa (AML), também tomou conhecimento da situação e garantiu às promotoras da subscrição que vai levar o tema a uma das próximas reuniões daquele órgão.
Há cerca de cinco anos, a Câmara de Lisboa removeu dois ecopontos localizados no final da Calçada da Palma, deixando apenas o vidrão. Nessa altura, foram colocados dentro dos prédios dois contentores de reciclagem (um para o cartão e o papel e outro para o plástico e o metal) dentro dos prédios da Rua das Laranjeiras e da Calçada da Palma. Os caixotes de lixo orgânico foram trocados por outros mais pequenos, de forma a que os três contentores coubessem dentro do prédio. O corredor de entrada, já estreito devido à tipologia da construção do edifício, torna-se ainda mais esguio com a acumulação de sacos de lixo pelas escadas acima. O cenário dificulta o dia-a-dia destes moradores que, muitas vezes, têm de afastar o lixo para chegarem às suas casas ou abrirem a caixa de correio.
“Acabo por sofrer mais com esta situação porque moro mesmo ao lado do lixo, os meus vizinhos talvez não sintam tanto. A porta principal é muito estreita e não cabem os caixotes todos. Só temos o caixote do lixo orgânico e o do papel e enchem muito rápido. É uma falta de higiene enorme o que se passa aqui”, comenta, ainda, Paula Vieira.
O panorama, dizem, é “assustador”. Todas as entradas dos prédios estão forradas de caixotes e há caixotes nos degraus. “Há prédios que provavelmente estarão piores, mas não conseguimos entrar em todos. Como se projectam obras e não se pensa na higiene urbana? Por que é que tenho de levar com a porcaria dos caixotes do meu prédio, quando a responsabilidade da recolha é da câmara?”, questiona Susana Quaresma, moradora e uma das autoras da petição.
A recolha do lixo orgânico é realizada três vezes por semana, à terça-feira, quinta-feira e sábado. No dia de Carnaval, um feriado facultativo, não houve recolha do lixo nem do papel e do cartão, que só é recolhido duas vezes por semana. Nessa semana, os contentores encheram e, por falta de espaço, o lixo já os transbordava. Estavam atulhados até ao topo.
“O dia de Carnaval foi dia de recolha do lixo orgânico, mas não houve recolha. Basta haver um feriado em que os camiões do lixo não passam e isto vira um caos. A escada do meu prédio está cheia de lixo e tenho estas caixas de cartão todas empilhadas na casa-de-banho das senhoras. Isto parece um armazém. Vou continuar a ter o espaço assim para os clientes?”, questiona, indignado, Humberto Pimenta, proprietário de um café na Calçada da Palma, enquanto aponta para o amontoado de caixas de cartão que se encontram junto aos lavatórios.
“Tiraram os ecopontos e espetaram-nos com os caixotes. Temos de guardar lixo dentro das nossas casas uma semana, porque a recolha do cartão só é feita uma vez. Muitas vezes, o meu marido vai ao vidrão e tem de trazer o lixo outra vez para trás, porque o ponto de vidro está cheio. Chegaram a existir três ecopontos, até alguém se lembrar de os retirar e ficar só o vidrão”, acrescenta Susana Quaresma, mulher de Humberto. Moram no prédio ao lado do estabelecimento de restauração.
Susana Quaresma, juntamente com Dalila Ferreira, ali moradora há 32 anos, entregou uma petição na Assembleia Municipal de Lisboa (AML), no passado dia 6 de fevereiro, a reivindicar a instalação de contentores subterrâneos. A vontade de avançar com a subscrição, que reuniu 400 assinaturas, adensou-se quando, no início deste ano, foi convocada uma reunião pela Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica para esclarecer os moradores das intervenções previstas para o Rossio de Palma, no âmbito do projecto Uma Praça em Cada Bairro. As moradoras foram ao encontro com o presidente da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica, António Cardoso (PS), e alguns funcionários da CML, convictas de que o ecoponto estaria contemplado na obra. Não estava, contudo, prevista nenhuma construção desta índole.
“Incentivei os moradores a irmos à reunião e surpreendeu-nos muito que a intervenção não previsse a criação de contentores. Perguntámos se era necessário fazer uma petição e as arquitectas que trabalham na câmara disseram-nos que não era preciso, que iam ter em consideração o nosso pedido. O que é certo é que nada foi feito. Enviamos-lhes um e-mail, mas nunca disseram nada. Vimo-nos obrigadas a redigir a petição”, conta Susana Quaresma, na qual se explica a importância de serem ali instalados contentores subterrâneos, por estes serem mais “amigos do ambiente”.
“Podiam aproveitar, uma vez que já estão a intervir, para fazerem já o ecoponto. É mais fácil levantar um ecoponto do chão ou vários caixotes do lixo por aqui fora? Parece-me que é mais fácil levantar só um que, se for relativamente grande, deve aguentar uma semana. Se não, só estão a ter mais gastos”, comenta Dalila Ferreira, 65 anos.
Com a acumulação do lixo nas entradas dos prédios, a deslocação de pessoas com limitações motoras ou o transporte de idosos numa maca, numa situação de urgência, torna-se mais difícil. “O meu vizinho teve um AVC com 50 anos e, durante muito tempo, a mãe tinha de o ajudar. Ele nem conseguia passar no meio desta confusão de lixo”, relata ainda a mesma moradora.
No caso de um incêndio ou de uma outra emergência, os caixotes do lixo, encavalitados pelas escadas acima, podem constituir, ainda, um obstáculo à entrada dos bombeiros nas casas. “Estes edifícios não estão projectados para isto. Quase não se consegue entrar em alguns prédios. Em alguns, as portas nem abrem, com caixotes dos dois lados e nos degraus. Como é que um bombeiro entra numa urgência? Está tudo a arder e ele diz ‘espere lá que temos de tirar os caixotes e, agora, temos de abrir a porta’”, ironiza Susana Quaresma.
Na Rua das Laranjeiras e na Calçada da Palma, há vários estabelecimentos comerciais, o que também tem levado a uma aglomeração de lixo dentro dos próprios estabelecimentos de restauração. “Aqui, só há duas soluções: ou recolhem diariamente porque há muito comércio e, por isso, muita produção de resíduos, ou colocam os ecopontos”, remata Susana Quaresma.
A Câmara de Lisboa, em depoimento escrito a O Corvo, avança que vai colocar um ecoponto subterrâneo na Calçada de Palma de Baixo, junto ao cruzamento com a Rua Carlos de Oliveira. “Já foi iniciada a verificação do local de instalação do ecoponto subterrâneo e, se tudo estiver conforme, iniciaremos a obra nas próximas semanas. Uma vez que o local de instalação se encontra numa zona de estacionamento, será necessária a retirada de três lugares”, anuncia. Para evitar possíveis maus cheiros, a autarquia aconselha os condóminos a acondicionar bem os seus resíduos e depositá-los nos contentores unicamente nos dias específicos de recolha.
“Em muitas áreas da cidade de Lisboa, existe edificado com características semelhantes às destes arruamentos, sendo que os condomínios devem organizar-se à semelhança do que já faziam com o contentor para resíduos indiferenciados. Se houver necessidade de repartir os contentores por diferentes locais do edifício, será conveniente manter os contentores dos resíduos indiferenciados e embalagens na casa do lixo e, o contentor do papel, no hall de entrada, por exemplo”, sugere a CML.
A autarquia garante, ainda, que a situação de acumulação de lixo não põe em risco a saúde dos habitantes. “Não existe nenhum risco de salubridade pública e saúde dos habitantes. Actualmente, 61 % da cidade de Lisboa tem um sistema de recolha selectiva porta-a-porta que, ao aproximar os locais de deposição de resíduos dos cidadãos, oferece uma maior facilidade e comodidade aos munícipes. Verifica-se, assim, que, nas áreas onde já existe recolha selectiva porta-a-porta consegue-se separar e valorizar uma maior quantidade de resíduos recicláveis. A recolha porta-a-porta tem sido considerada uma boa prática, sendo Lisboa um bom exemplo ao nível da União Europeia”, adianta.