Câmara de Lisboa diz que impedir criação de novos hotéis travaria riqueza e emprego
A Câmara Municipal de Lisboa (CML) recusa considerar a possibilidade de proceder a uma suspensão do licenciamento de novas unidades hoteleiras, pelo impacto que tal medida teria na criação de riqueza e de emprego para a cidade. “Não acredito que seja por essa via do congelamento do licenciamento hoteleiro que vamos resolver o problema da habitação em Lisboa”, afirmou Manuel Salgado, vereador com o pelouro do Urbanismo, em resposta a uma interpelação nesse sentido por parte de uma eleita comunista na Assembleia Municipal de Lisboa (AML), na sessão de perguntas à câmara realizada na tarde desta terça-feira (23 de maio). A solução para a falta de habitação, garante Salgado, passa pela criação já anunciada pelo município de bolsas de habitação a custos controlados.
O comentário do vereador surgiu em resposta a um diagnóstico devastador, feito pela deputada municipal Lúcia Gomes (PCP), das condições de acesso à habitação por parte das classes não privilegiadas economicamente. “Todos os dias, há notícias de novos despejos em áreas centrais da cidade. As rendas e a especulação imobiliária não páram de aumentar. Ao mesmo tempo que chegam os ricos de Hollywood, saem os trabalhadores e as suas famílias”, afirmou a eleita comunista, lamentando que a Câmara de Lisboa tenha optado “por nada fazer”. Mais que isso, acusou a autarquia da capital de uma “política do bling-bling, do favorecimento dos turistas endinheirados”, utilizando as receitas da taxa turística para investir em medidas que, diz, não só não resolvem como têm “agravado bastante o problema da carência de habitação acessível”.
Lúcia Gomes recordou, de seguida, as estatísticas que fundamentam tais acusações. A começar pelos preços da habitação para arrendamento, que terão subido entre 3% a 36%, nos últimos quatro anos. Valor que se agrava para 46% quando se fala na compra de habitação própria – o que terá como consequência uma taxa de esforço entre 40% a 60% do rendimento familiar com a aquisição desses imóveis. “No que diz respeito ao arrendamento, a procura era, em 2015, nove vezes superior à oferta. Há já algumas freguesias em Lisboa em que um quinto das casas é destinada ao alojamento local, sempre em detrimento do alojamento permanente”, afirmou a deputada municipal do PCP, lembrando que a aquisição de imóveis por capital estrangeiro representa já 18%. Lembrando uma recomendação apresentada pelo seu partido, em 2016, visando limitar os alojamentos locais, a deputada comunista instou a CML “ a suspender o licenciamento de novas unidades hoteleiras” e a proceder a uma avaliação de imediato das existentes.
As propostas não foram bem acolhidas por Manuel Salgado. Lembrando que a maior parte do que é reclamado pelo PCP, sobretudo no que se refere à limitação do alojamento local, corresponde a competências da administração central, o vereador mostrou clara discordância com a adopção das “poucas medidas” sugeridas pelos comunistas que efectivamente dependem da câmara. Ou seja, travar o licenciamento de hotéis. De acordo com Salgado, nos últimos dois anos, os seus serviços terão emitido 33 licenças para unidades hoteleiras na cidade, correspondentes a uma área total de cerca de 150 mil metros quadrados. “Se parássemos de autorizar hotéis e esta área fosse toda transformada em habitação, tal corresponderia a 800 fogos”, disse. “É evidente que tal número é importante. Mas eu pergunto: quantos empregos e quanta riqueza foi criada em Lisboa pelo facto de termos o turismo que temos?”, lançou.
Desvalorizando a existência de uma relação directa entre o licenciamento de unidades hoteleiras e a escassez de habitação permanente, Manuel Salgado garante que a melhor forma de a CML combater o problema é “investir forte” no Programa Renda Acessível – apresentado pela autarquia em abril do ano passado, promete a construção de 5 a 7 mil fogos de tipologias T0, T1 e T2, com rendas entre os 250 e os 450 euros, em 15 localizações da capital. O programa, que apenas deu os primeiros passos há dois meses, com a aprovação do concurso público para um conjunto de 160 apartamentos na Rua de São Lázaro, é qualificado por Salgado como “absolutamente essencial”. Sobre o fenómeno do alojamento local, o vereador alijou responsabilidades. “São edifícios de habitação e o uso que lhes é dado não depende de licenciamento municipal, nem a lei prevê que dependa. Essa questão deve ser colocada ao governo central e não à Câmara Municipal de Lisboa”, afirmou.