Entrada da EMEL em Telheiras divide opiniões, mas maioria pede regularização do estacionamento

REPORTAGEM
Sofia Cristino

Texto

MOBILIDADE

Lumiar

3 Outubro, 2018

A EMEL vai entrar em Telheiras até ao final do ano. Há quem estacione em segunda fila só para fazer compras no bairro e, nos dias de jogos de futebol, no Estádio de Alvalade, chegam a ver-se carros em terceira fila, em cima dos passeios e em espaços verdes. A maioria dos moradores quer que a empresa municipal comece a operar rapidamente no bairro. Mas também há quem não concorde com a anunciada mudança no parqueamento. A Associação de Residentes de Telheiras lançou uma petição a exigir a gratuitidade do primeiro dístico dos residentes e que seja feito um levantamento das necessidades de estacionamento de quem frequenta o bairro. O presidente da Junta de Freguesia do Lumiar diz estar disponível para ouvir as propostas dos moradores durante o mês de Outubro.

A partir de Dezembro, vai ser mais difícil encontrar lugar para parar o carro, em Telheiras, na freguesia do Lumiar, um dos poucos bairros de Lisboa onde ainda há estacionamento gratuito. A gestão do parqueamento vai ser entregue à Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa (EMEL) e a maioria dos moradores, cada vez com mais dificuldade em estacionar, aplaude a vinda da fiscalização. A zona, conhecida pela sua pacatez, nunca sofreu tanta pressão a nível do estacionamento, muitos param nos passeios, em espaços verdes e em segunda fila, só para fazerem compras. Nos dias de jogos de futebol, no Estádio de Alvalade, vêem-se vários carros em terceira fila. “Temos de ser criativos para encontrar lugar. Nas artérias principais, é um caos, os carros apitam o dia todo, e ruas com duas faixas de rodagem passam a ter só uma. Está a ficar insuportável”, critica Maria Saramago, 32 anos, moradora em Telheiras há 27 anos.

Mais do que uma vez, uma vizinha de Maria teve de apanhar um táxi para se deslocar ao hospital, por não conseguir sair de carro, bloqueado por outro estacionado em segunda fila. “A minha vizinha é portadora de uma deficiência, é inadmissível isto acontecer. Há, também, pessoas a chegarem atrasadas ao trabalho por não conseguirem sair, há uma enorme falta de civismo”, diz ainda. Com a chegada da EMEL à maior parte das freguesias de Lisboa, a procura por áreas de estacionamento gratuitas aumentou, tornando-se Telheiras uma zona mais apetecível para deixar o carro. A proximidade à estação de metro, os bons acessos rodoviários e o crescimento do número de estabelecimentos de ensino na freguesia também contribuíram para o aumento do tráfego.

sdr

Muitos deixam o carro no bairro, antes de apanharem o metro para o centro da cidade

Todos os dias, há muita gente a chegar ao bairro só para deixar o carro e apanhar o metro para o centro da cidade, situação evidenciada ao final do dia, quando esses lugares são desocupados. “À noite ficamos, novamente, com muitos lugares, porque muitos estacionam aqui, mas trabalham no centro de Lisboa”, conta ainda Maria Saramago. Uma visão partilhada por Isabel Costa, 35 anos. “Venha a EMEL, tem mesmo de ser, isto está caótico. Há muito congestionamento e é cada vez mais difícil estacionar”, comenta. Maria Pia Lemos, 65 anos, moradora há 40 anos em Telheiras, também está satisfeita com a vinda da EMEL. “Há dez vezes mais carros a circular do que há 30 anos e o bairro não está adaptado, não foi construído a pensar nesta realidade. Só os prédios mais recentes têm garagem. Vai ser muito melhor para os moradores”, acredita.

 

João Rodrigues, 39 anos, não está tão receptivo à chegada da empresa regularizadora do estacionamento, embora admita ser uma inevitabilidade. “É a única solução, mas o ideal seria investir-se mais nos transportes públicos. A EMEL, por si só, não traz qualquer vantagem se não houver uma melhoria dos transportes, que leve a uma redução acentuada do número de carros que entra em Lisboa”, sugere o morador. Nos estabelecimentos comerciais, as opiniões também divergem. Alguns comerciantes temem perder clientes com a tarifação do estacionamento e receiam que a deslocação de carro para o trabalho se torne insustentável. “São poucos os comerciantes que moram aqui, não ganhamos para pagar o lugar de estacionamento. O comércio vai ser prejudicado”, diz Sónia Pitorro, 38 anos, funcionária de uma pastelaria.

 


 

A maioria, contudo, pede a chegada da empresa municipal com celeridade. Elisabete Viana, 78 anos, moradora e comerciante na Rua Francisco Gentil, uma das artérias principais de Telheiras, acredita que a vinda da EMEL até pode atrair mais pessoas ao bairro. “Perdi clientes com a chegada do metro, quando começaram a vir mais pessoas de fora estacionar. Com o ordenamento do parqueamento, pelo menos, os meus clientes têm lugar”, comenta uma das lojistas mais antigas. Nuno Miguel, 42 anos, funcionário numa churrasqueira, critica a utilização “abusiva” do espaço público e também exige uma intervenção. “Estão a abrir muitas lojas em Telheiras, que já é uma zona com muito comércio. É mesmo preciso regularizar o estacionamento”, diz o comerciante, que se desloca de bicicleta para o trabalho.

 

Logo pela manhã, não é difícil encontrar lugar em Telheiras. Quem chega, diariamente, para trabalhar, ou quem deixa ali o carro para depois se deslocar de transportes públicos, vai aumentando a pressão do estacionamento de superfície ao longo do dia. Por esse motivo, a Associação de Residentes de Telheiras lançou uma petição a exigir que o plano de parqueamento pago para aquela parte da cidade seja discutido com os moradores antes de ser implementado. “Sendo inevitável a entrada da EMEL, exigimos que hajam algumas condições para os moradores, queremos ter a garantia que serão beneficiados”, diz Manuel Silva, autor do abaixo-assinado.

 

O grupo de habitantes defende o aumento do policiamento, mas, na falta de uma alternativa à entrada da EMEL, propõe ajustes ao plano proposto pela empresa municipal. “Estamos contra a vinda da EMEL porque não alinhamos na forma como actua e rejeitamos soluções desadequadas à realidade do bairro. A polícia municipal nunca vem para aqui e, quando vem, são os residentes os mais prejudicados”, diz o peticionário. Os subscritores querem que o dístico de residente para moradores em Zonas de Acesso Automóvel Condicionado, com um valor anual de 12 euros, seja gratuito, e propõem a criação de bolsas de estacionamento exclusivas para residentes. A Associação de Residentes de Telheiras pede, ainda, um levantamento das necessidades de estacionamento dos habitantes e dos comerciantes, serviços, escolas e utilizadores habituais do bairro e a criação de lugares ajustados a estas carências.

 

 

Os moradores dizem estar disponíveis a cooperar na inventariação dos espaços de estacionamento e do número de viaturas de residentes e utilizadores prioritários do bairro, de modo a existir “um equilíbrio entre procura e oferta de estacionamento”. Manuel Silva acredita que os lugares existentes em Telheiras são suficientes para moradores e comerciantes e que a solução também passará pela criação de estacionamento junto às escolas. “O Colégio Mira Rio já abriu com legislação que obriga à construção de estacionamento, mas não foi construído. Veio causar grande perturbação em termos de estacionamento e tráfego e, em conjunto com outras escolas, criou muita pressão na zona”, afirma.

 

Ante a inevitabilidade da chegada da EMEL ao bairro, os peticionários apelam à adopção do que vêem como mal menor: a criação de uma única Zona de Estacionamento de Duração Limitada (ZEDL) em vez das duas previstas no plano da empresa municipal. Pedem ainda a colocação de cancelas em alguns bairros residenciais e a reposição de um antigo silo automóvel junto à interface do Campo Grande. “O silo foi desmantelado há uns anos, tinha dois pisos e capacidade para cerca de 300 carros, e agora está lá um espaço vazio, que poderá servir de dissuasor de estacionamento”, propõe Manuel Silva. Este grupo de habitantes de Telheiras rejeita ainda a criação de quaisquer soluções com incidência ao nível do tráfego que, directa ou indirectamente, alterem a circulação rodoviária, levando à transformação de arruamentos urbanos em “vias rápidas”.

 

A preocupação com o melhoramento dos transportes públicos também é notória na petição, a qual exige uma maior frequência de passagem da carreira 778, que serve o bairro do Alto da Faia e o centro do bairro, e ainda o prolongamento da Linha Verde do metro para a zona ocidente. Durante o mês de Outubro, estes moradores vão participar em reuniões públicas e dar a conhecer a sua posição sobre o plano de ordenamento do estacionamento. Esta quarta-feira (3 de Outubro), vão intervir na reunião descentralizada da Câmara Municipal de Lisboa (CML), que se destina, preferencialmente, aos munícipes das freguesias de Santa Clara e do Lumiar.

 

 

O presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, Pedro Delgado Alves (PS), em declarações a O Corvo, garante que a entrada da EMEL na freguesia é desejada pela maioria dos habitantes, mas diz estar disponível para ouvir as sugestões dos habitantes. “A Associação de Residentes de Telheiras tem promovido a discussão deste tema e mostrado vontade em definir, em conjunto com a EMEL, os arruamentos tarifados. Já há algumas propostas das zonas para residentes e queremos perceber se são suficientes e se todos concordam”, afirma.

 

Em Novembro, serão emitidos os primeiros dísticos dos residentes e a EMEL começa a instalar-se naquela zonada cidade em Dezembro. Brevemente, vai ser montado um posto de atendimento descentralizado da EMEL, no Lagar da Quinta de São Vicente, de forma a acelerar o processo de implementação. Delgado Alves diz que a freguesia não podia esperar mais e considera o estacionamento junto às bocas do metro “um caso flagrante”. “A zona mais penalizada encontra-se junto à estação de metro de Telheiras, com o estacionamento de não residentes. Esta situação também penalizou o comércio, porque não há lugares para quem quer ir às compras”, diz o autarca.

 

A pressão no estacionamento, explica ainda, aumentou com a entrada da EMEL em freguesias vizinhas. “Há uma pressão nova causada pelos novos parquímetros do lado das Torres de Lisboa, na freguesia de São Domingos de Benfica. As pessoas estacionem do lado de Telheiras e atravessem a ponte pedonal da Galp, criando-se muita pressão de estacionamento do lado de cá”, exemplifica. “É mesmo indispensável que haja este ordenamento e parece-nos que o caminho é proteger as zonas residenciais em torno das bocas do metro”, conclui.

 

O Corvo questionou ainda a EMEL sobre os pormenores do plano de ordenamento do estacionamento previsto para a freguesia do Lumiar, quantos lugares tarifados vai destinar a moradores e de que forma vão ser distribuídos, e se está disponível a dialogar com os residentes. Mas, até ao momento da publicação deste artigo, não obteve resposta.

MAIS REPORTAGEM

COMENTÁRIOS

  • José Silva Pinto
    Responder

    Há necessidade da EMEL garantir que existirão em Telheiras zonas de estacionamento exclusiva para os residentes, bem como zonas (9-19) para o estacionamento de curta duração (15m) para quem vai ao comércio local.
    E, sobretudo, que seja encontrada uma solução que salvaguarde os residentes em dias de futebol no estádio de Alvalade (a menos que a CML deseje baixar o IMI no bairro).

    • Inês Fonseca
      Responder

      Concordo com José Pinto.

      • Pedro Silva
        Responder

        Completamente de acordo com José Pinto.

  • Manuel Alves
    Responder

    Estacionamento e transportes

    Estacionamento ordenado podia e devia ser melhorado; mas a EMEL (e a CMLisboa que lhe concedeu esta ‘vaca leiteira’ e não acautelou a obrigação de licenciar edifícios obrigatoriamente com estacionamento suficiente!) vai COBRAR e MULTAR, cada vez mais e em todo o lado; a divisão do território em zonas pequenas é mais uma ‘manobra’ para os residentes pagarem também estacionamento, pois não existem lugares para todos na sua zona nem na vizinha, e vão ter de procurar estacionamento mais longe, a pagar!! e com perda de tempo, ‘nervos’ e combustível !!! — e quem ‘pede’ a vinda da EMEL ainda se vai arrepender.

    O problema de estacionamento não se pode desligar/analisar deixando de fora as questões de planeamento urbano, construção e transportes coletivos.
    E, quanto a transportes coletivos, está a ser continuadamente adiada/esquecida/alienada a expansão do Metro para o arco norte e mais interligações na rede, i.e., as linhas ‘verde’ e ‘vermelha’ já deviam ter sido prolongadas para a Alta de Lisboa, Paço do Lumiar novo, J.Luz/Carnide, … e ter ligação à linha ‘azul’ e à ‘amarela’. — a ligação da ‘vermelha’ ao Campo Grande (em vez de passar mais a norte) pouco beneficia os cidadãos e vai criar um ‘interface monstro’ e sem capacidade de estacionamento; e o ‘desvio da ‘amarela’ e da ‘verde’ para fazer uma ‘circular’ vai piorar o acesso ao centro da cidade, aumentando o tempo de transporte/transbordo e o desconforto dos passageiros.

    A maior frequência (horária e semanal) de algumas carreiras Bus (778) é desejável, atenua, mas não resolve, e o mesmo se pode dizer das ciclovias e bicicletas ‘Giras’ (as elétricas deviam ser muito mais) …

    E note-se que o investimento em transportes coletivos públicos (especialmente ‘de massa’/comboios/metro elétricos) é a opção mais eficiente (mais barata a médio prazo, e a que cumpre o objetivo de satisfazer as necessidades dos cidadãos e dum território com qualidade ambiental).

  • LUÍSA Alves
    Responder

    Temos de exigir as medidas de acalmia de trafego eque foram discutidas com o presidente da JFpara a rua Prof João Barreira.

  • José Colaço
    Responder

    A EMEL também tem de chegar á Estrada da Luz /Carnide, Largo da Luz, Rua Padre Américo, etc. Também estamos a sofrer com os parquímetros nas Torres de Lisboa e dos empregados do C.C.Colombo. Venha a EMEL.

  • António Rogério Martins
    Responder

    Lamentavelmente neste país nunca ninguém está satisfeito com o que se faz.
    Que a EMEL venha cobrir a zona da Av. Almirante Gago Coutinho, particularmente entre a Av. Estados Unidos da América e a Praça Francisco Sá Carneiro e creio que toda a gente deve agradecer.
    Tal como é relatado o que se passa em Telheiras, nesta zona a situação repete-se: Metro, comboios, autocarros, vendedores de automóveis, automóveis em espera para reparação, há de tudo.
    Excepção para quem aqui mora que mesmo tendo dístico de residente, lhe permite de vez em quando ter a sorte de conseguir um lugar, mesmo que um pouco afastado da sua residência.

Deixe um comentário.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

O Corvo nasce da constatação de que cada vez se produz menos noticiário local. A crise da imprensa tem a ver com esse afastamento dos media relativamente às questões da cidadania quotidiana.

O Corvo pratica jornalismo independente e desvinculado de interesses particulares, sejam eles políticos, religiosos, comerciais ou de qualquer outro género.

Em paralelo, se as tecnologias cada vez mais o permitem, cada vez menos os cidadãos são chamados a pronunciar-se e a intervir na resolução dos problemas que enfrentam.

Gostaríamos de contar com a participação, o apoio e a crítica dos lisboetas que não se sentem indiferentes ao destino da sua cidade.

Samuel Alemão
s.alemao@ocorvo.pt
Director editorial e redacção

Daniel Toledo Monsonís
d.toledo@ocorvo.pt
Director executivo

Sofia Cristino
Redacção

Mário Cameira
Infografías 

Paula Ferreira
Fotografía

Margarita Cardoso de Meneses
Dep. comercial e produção

Catarina Lente
Dep. gráfico & website

Lucas Muller
Redes e análises

ERC: 126586
(Entidade Reguladora Para a Comunicação Social)

O Corvinho do Sítio de Lisboa, Lda
NIF: 514555475
Rua do Loreto, 13, 1º Dto. Lisboa
infocorvo@gmail.com

Fala conosco!

Faça aqui a sua pesquisa

Social Media Auto Publish Powered By : XYZScripts.com

Send this to a friend