Afinal, expansão do Metro para a zona ocidental de Lisboa avança ou não? Sobram dúvidas e contradições

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Samuel Alemão

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Ajuda
Alcântara
Belém

22 Outubro, 2018

A há muito prometida expansão da rede do Metropolitano de Lisboa para a zona ocidental da cidade pode, mais uma vez, não passar de um desejo frustrado. A população das freguesias de Alcântara, da Ajuda e de Belém deverá ter de se contentar com um plano de transporte público alternativo ao Metro, o qual a Câmara Municipal de Lisboa (CML) está a preparar, conjuntamente com a de Oeiras, para ligar Alcântara ao Jamor, como foi revelado, na passada quinta-feira (18 de Outubro), em entrevista ao jornal Público, pelo vereador da Mobilidade, Miguel Gaspar. De acordo com esse plano, a nova ligação assegurará um anel de transporte público naquela zona, através ainda da extensão ao Jamor da linha do eléctrico 15 – que hoje termina em Algés. O autarca acrescentou que o investimento no “metro pesado” naquela zona da capital “não se justifica”, devido aos custos que tal obra acarretaria.

 

Afirmação que não deixa de ser surpreendente, uma vez que a negociação com a administração central para a realização de tal investimento é uma das prioridades do acordo de governação da CML estabelecido, há um ano, entre o PS e o Bloco de Esquerda (BE). Uma vontade reafirmada mais tarde, em Janeiro deste ano, através de uma votação unânime da vereação num ponto de uma moção apresentada pelo PCP em que se pedia ao Governo a tomada de medidas, “com carácter prioritário”, para expandir a rede de metro para a zona ocidental da capital. A O Corvo, e após lhe ter sido solicitada uma clarificação, fonte do gabinete do vereador assegura estarem em curso negociações para que “sejam feitos os estudos para expandir a Linha Vermelha até Alcântara”.

Na referida entrevista, o vereador salienta que a solução agora a ser estudada como alternativa ao Metro – e que poderá ser materializada através de uma linha de eléctrico ou um de autocarro rápido em linha dedicada, conhecido por sistema BRT, com paragens no Pólo Universitário da Ajuda, Hospital São Francisco Xavier, Miraflores e Linda-a-Velha – faz parte do Plano de Mobilidade da Zona Ocidental constante do tal acordo assinado entre socialistas e bloquistas. Essa constitui-se, de facto, como a terceira prioridade relativa à área da mobilidade do documento onde constam as “bases de convergência” entre PS e BE neste mandato autárquico.

 

O primeiro ponto do mencionado acordo refere-se à redução dos tarifários e o segundo à expansão do Metropolitano de Lisboa para a zona poente da capital. “Renegociação com o Governo sobre a expansão da rede de Metropolitano, incluindo a extensão da linha para a zona ocidental de Lisboa como prioridade a par da linha circular. O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa apresentará os resultados desta negociação durante o primeiro semestre de 2018”, lê-se no texto rubricado por Fernando Medina e Ricardo Robles, numa cerimónia no Teatro São Luiz, a 2 de Novembro de 2017.

A extensão do Metro para as freguesias ocidentais da capital era, aliás, uma das bandeiras eleitorais do Bloco de Esquerda (BE), que antes das autárquicas salientou sempre a prioridade de tal investimento em detrimento da construção da Linha Circular – que resultará da junção das actuais linhas Amarela e Verde, através de uma ligação entre o Rato e o Cais do Sodré, com novas estações na Estrela e em Santos. Um projecto do qual o Bloco sempre foi fortemente crítico, tal como, aliás, o PCP e o PSD – tendo ambos os partidos manifestado a sua preferência pelo alargar da rede do ML para a zona ocidental de Lisboa ao invés da referida linha central em anel, apenas defendida com convicção pelo PS.

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A negociação da expansão à zona ocidental foi a moeda de troca para o Bloco aceitar a Linha Circular

O estabelecimento do acordo de convergência entre PS e BE levou então à solução de compromisso para que a CML e sobretudo o seu presidente, Fernando Medina (PS), para se avançar para a “renegociação com o Governo sobre a expansão da rede de Metropolitano, incluindo a extensão da linha para a zona ocidental de Lisboa como prioridade a par da linha circular”. Nessa altura, no fim da sessão de assinatura do entendimento, O Corvo questionou Robles sobre se seria mesmo possível avançar para as duas linhas ao mesmo tempo. “As obras podem seguir a par uma da outra, mas não têm que ser em simultâneo”, respondeu o vereador bloquista, com assentimento de Medina, a seu lado.


Uma ideia que o vereador da Mobilidade deixa agora cair, com as declarações ao Público. Isto apesar de o autarca ter votado favoravelmente – juntamente com o resto da vereação, incluindo todos os eleitos da oposição – o ponto de uma moção apresentada, a 31 de Janeiro, pelo PCP, no qual se pede ao Governo de António Costa que desencadeie “os procedimentos necessários à expansão da rede do metro para a zona Ocidental da Cidade, com carácter prioritário, bem como à concretização faseada de outras soluções anteriormente estudadas (como as ligações transversais entre linhas ainda não concretizadas)”.

 

A mudança de posição da Câmara de Lisboa leva agora o PCP a pedir um explicação pública da autarquia sobre o assunto. “Este cenário nunca antes havia sido colocado, ficámos a saber dele pelas notícias. É um posicionamento surpreendente, pelo que a Câmara de Lisboa deve vir esclarecê-lo”, pede, em declarações a O Corvo, o vereador comunista João Ferreira, para quem tal postura da câmara ajuda para contribuir para “adiar investimentos que fazem falta”. Mas, para Ferreira, não é só o vereador Miguel Gaspar (PS) que deve clarificar a sua posição. “O Bloco acabou por apoiar o PS na defesa da Linha Circular, foi parte do preço que pagou pelo acordo. Agora, também seria curioso ouvir o que têm a dizer”, instou.

 

Também o CDS critica a opção agora anunciada. “A ligação de um circuito de BRT (ou eléctrico) ao eléctrico 15 da Carris é uma não solução. Este circuito deveria ligar-se directamente à rede de metro, caso contrário não se consegue promover a transferência de utilizadores do automóvel para o transporte colectivo. O eléctrico 15 não consubstancia uma solução rápida para quem reside em Lisboa, muito menos para quem vem de Oeiras.”, diz o vereador centrista Miguel Moreira da Silva, em depoimento escrito a O Corvo. O autarca diz, todavia, estar disponível para estudar os detalhes do plano “se o eléctrico rápido ou o BRT se equipararem ao metro em termos de experiência de utilização e capacidade de transporte”.

 

Moreira da Silva assegura que o “O CDS defende uma aposta ambiciosa no transporte colectivo intermodal, sendo que o metro actualmente se afigura como a solução técnica que melhor garante a ligação de Belém até São Sebastião, através da expansão da linha vermelha”. O vereador centrista considera que a expansão do metro deve ser feita de forma coordenada com uma política de “park & ride”, ou seja, de construção de parques estacionamento nos pontos de elevado fluxo de entrada de automóveis em Lisboa, promovendo a transferência do modo rodoviário individual para o modo colectivo. É o caso, nota, da A5.

 

 

A mudança de planos merece igualmente uma forte reprimenda por parte do PSD. “Este é um bom exemplo do desnorte do PS em Lisboa, em que cada vereador acha que é o presidente da câmara e em que este age como se fosse o número dois do Governo”, critica o vereador João Pedro Costa, considerando que a revelação das novas orientações  da CML relativas à expansão do metro para a zona ocidental têm, todavia, uma vantagem: “finalmente, há uma clarificação”.

 

O autarca laranja defende ainda que não basta assegurar uma extensão da Linha Vermelha a Alcântara para se considerar que a expansão à zona ocidental será alcançada. O projecto do PSD, salienta João Pedro Costa, prevê o crescimento dessa linha, com estações em Campolide, Amoreiras, Campo de Ourique, Prazeres, Ajuda, Pólo Universitário da Ajuda e Torres do Restelo, podendo depois tal ligação terminar em Algés ou divergir para Miraflores, Linda-a-Velha e Carnaxide.

 

Já o presidente da Junta de Freguesia de Alcântara, Davide Amado (PS), vê com bons olhos a apresentação da tal linha alternativa de transportes públicos, embora refira a O Corvo que, “pessoalmente”, sinta que “o que faria mais sentido seria a extensão da Linha Vermelha do metro até Alcântara”. Lembrando as crónicas debilidades de mobilidade na freguesia, sobretudo na zona alta, o edil defende ser mais importante encontrar soluções tecnicamente válidas, “sejam elas ligeiras ou pesadas”.

 

“Temos de ter paciência e calma, porque estamos a falar de investimentos de muitos milhões, que demoram a concretizar e dependem do Governo. Estamos no bom caminho, a câmara está a fazer um bom trabalho. Ficaria preocupado se não se estivesse a fazer nada”, afirma Davide Amado, que defende a aposta na utilização da Linha de Cintura da ferrovia como ligação preferencial ao centro da cidade, equiparando-a uma linha de metro  – uma solução, aliás defendida por Miguel Gaspar, que fala nela como “uma quinta linha do metro”. “De Alcântara a Oriente são 20 minutos”, diz o presidente da junta.

 

Menos compreensivo com a aparente mudança de planos anunciada pela CML relativamente à expansão da rede do ML para ocidente é Fernando Rosa (PSD), presidente da Junta de Freguesia de Belém. “Continuamos a ser o parente pobre da cidade em termos de transportes e continuamos a ser enrolados na questão do metro. Belém é Lisboa e no campo da mobilidade continua a ser tratada como se não fosse”, diz o autarca, reconhecendo, porém, que a nova ligação entre Alcântara e o Jamor até pode ser positiva. “É sempre bom ter um novo sistema de transportes. Mas não acredito que tenha a mesma eficácia do metro”, diz.

 

Questionado por O Corvo sobre se as declarações do vereador significam que o projecto de expansão do Metropolitano de Lisboa à Zona Ocidental de Lisboa foi abandonado, um membro do seu gabinete desmente tal cenário. “Pelo contrário. Significam que a Câmara de Lisboa pretende que o Metropolitano chegue efetivamente à Zona Ocidental, nomeadamente a Alcântara pela expansão da Linha Vermelha. Além disso, está a ser estudada uma solução de transporte coletivo estruturante que fará a ligação a Oeiras, provavelmente com um prazo de execução mais curto e menos exigente do ponto de vista dos recursos e com uma melhor integração no território”, esclarece.  “As negociações com o Governo estão em curso, sendo intenção da Câmara, conforme referido, que a par da Linha Circular, sejam feitos os estudos para expandir a Linha Vermelha até Alcântara”, acrescenta a mesma fonte.

 

Contactada por O Corvo, fonte do gabinete de Manuel Grilo, vereador do Bloco que substituiu Ricardo Robles, escusou-se a comentar o assunto, embora se recuse ler as declarações de Miguel Gaspar relativas ao Metro como uma desistência face ao delineado no acordo assinado com o PS.

 

O Corvo tentou ainda auscultar o presidente da Junta de Freguesia da Ajuda, Jorge Marques (PS), sobre esta matéria, mas tal não foi possível até ao momento da publicação deste artigo.

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