Revelamos os achados arqueológicos do Carmo
REPORTAGEM
Samuel Alemão
Texto
Sandra Isabel Oliveira
Vídeo
URBANISMO
Santa Maria Maior
10 Março, 2014
A construção da ligação entre o Chiado e o Largo do Carmo desenterrou uma série de ossadas e artefactos acumulados ao longo de sete séculos. As escavações deixaram ainda a descoberto, pela primeira vez desde a sua construção, as fundações do Convento do Carmo. Imaculadas e com as marcas originais dos canteiros medievais que as trabalharam.
As escavações arqueológicas junto ao Convento do Carmo, relacionadas com a última parte do projecto de Siza Vieira para o Chiado, denominada de Pátio B, têm-se revelado uma caixa de surpresas. Iniciada em Julho do ano passado, a última fase dos trabalhos arqueológicos – começados em 2008, pelo Centro de Arqueologia de Lisboa (CAL), ligado à câmara municipal – destapou coisas nunca vistas desde a Idade Média. É o caso das fundações do templo, cuja construção data de 1389. Trata-se, sem dúvida, de um tesouro no coração da cidade. De tal forma que, como O Corvo noticiou há cerca de um mês, o projecto do arquitecto portuense para esta nova ligação entre o Chiado e o Largo do Carmo, também designada como Terraços do Carmo, teve de ser reajustado.
Para além de desenterrar diversos corpos e uma parte da cabeceira da igreja que esteve debaixo da terra desde a sua edificação – deixando à vista toda uma faixa de pedra de uma alvura impressionante e na qual são visíveis, quase imaculadas, as originais marcas dos canteiros que a trabalharam -, a escavação trouxe ao de cima uma série de outros achados. De antes e de depois do terramoto de 1755. Referentes a um arco temporal compreendido entre os séculos XIV e XX, foram ali encontrados moedas, cerâmicas, vidros, metais, faunas e artefactos em madeira, entre outros. Todos eles estão agora a ser avaliados e catalogados nos laboratórios do CAL – que desenvolve o trabalho de campo em parceria com a empresa Neoépica.
Mas o que deverá surpreender os visitantes da futura passagem pedonal e parte do espaço público, quando for esta inaugurada – ainda não existe data, depois do atraso provocado pela chuva dos últimos meses -, será algo que, paradoxalmente, sempre esteve a descoberto. A vertente setenterional da cabeceira desta igreja gótica, apreciada a partir dos terrenos onde antes existiam uns desqualificados anexos ao quartel da Guarda Nacional Republicana, num patamar sobranceiro à Rua do Carmo, ganha uma majestada nunca antes vista. Quando ali se está, espanta nunca antes nos termos apercebido da real monumentalidade do convento. Sensação reforçada pelo desenterramento da base – cuja qualidade impressionou tanto os arqueólogos como a equipa de Siza Vieira. Revelar-se-á uma nova e bela faceta de Lisboa.
Mas outras coisas serão motivo de curiosidade. Na vertente sul da igreja, junto ao passadiço metálico que hoje garante a ligação entre o Largo do Carmo e o topo do Elevador de Santa Justa, foi posta a descoberto a ruína de uma capela. O que veio atrapalhar um pouco o plano inicial de Siza Vieira de rebaixar à cota da rua o pavimento em redor das ruínas com o objectivo, precisamente, de substituir o referido acesso artificial. A descoberta veio, por isso, motivar as alterações agora em preparação. Mudança de planos que acaba por aumentar a expectativa sobre aquele que será o aspecto final de um lugar com imensa importância histórica.
O Corvo ouviu no local as explicações dos arqueólogos Raquel Santos, da empresa Neoépica, e António Marques, do CAL, sobre o que tem sido descoberto em redor do Convento do Carmo. E mostra pela primeira vez algumas das coisas que estiveram séculos sob a terra.