Comentários


 

Pergunta

1- Gostava de saber qual é a estrutura da tragédia grega? Como e quando surgiu? Que elementos (personagens) a compõem?

2- Na mitologia grega o que significa "fio de Ariadna"?

Resposta


Sobre a origem da tragédia ateniense e sobre as suas características há bastante bibliografia de fácil acesso. O primeiro livro a tratar desse assunto é de Aristóteles - A Poética -, escrito no século IV AC.

Recomendar-lhe-ia, porém, dois livros de divulgação em português:

PEREIRA, Maria Helena da Rocha Pereira, Estudos da história da cultura clássica. Vol. I: Cultura Grega. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1979.

ROMILLY, Jacqueline, A tragédia grega. Lisboa : Edições 70, 1999.

Independentemente do que neles pode ler, adiantaria já que se presume que a tragédia tal como a conhecemos terá surgido em Atenas no século V AC a partir dos ditirambos em honra do deus Diónisos (ou Dioniso) e evoluiu integrando a história dos heróis gregos. O primeiro grande autor de tragédias é Ésquilo, que viveu entre 525 a 456 AC, e a ele seguiram-se Sófocles e Eurípedes. Do primeiro talvez se conheçam melhor a Oresteia e Prometeu Agrilhoado. De Sófocles são sobretudo conhecidas O rei Édipo e Antígona. De Eurípedes, as que mais vezes são referidas são Medeia e As bacantes.

Normalmente a tragédia apresenta um herói nobre, dotado de qualidades, mas que comete um erro ao desafiar o destino ou os deuses e que acaba por encontrar um castigo que muitas vezes é a morte. A circunstância de o herói ser uma personagem nem muito boa nem muito má faz com que os espectadores se identifiquem com ele e se comovam com o seu sofrimento.


2- Na mitologia grega o que significa "fio de Ariadna"?


Tendo em conta o seu interesse por esta questão, não resisto a transcrever o que sobre esta história se pode ler no belíssimo livro de Edith Hamilton:


HAMILTON, Edith, A mitologia (1942). Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1983, pp. 217-220


(...) Anos antes da chegada [de Teseu] a Atenas tinha acontecido uma grande desgraça à cidade. Minos, o poderoso rei de Creta, havia perdido o filho único, Andrógeo, aquando de uma visita ao rei ateniense. O rei Egeu, na altura, fez o que nenhum hospedeiro devia fazer - enviou o seu hóspede numa perigosa expedição, que tinha por fim matar um toiro terrível. Aconteceu, porém, que o toiro matou Andrógeo. Como represália, Minos invadira a região, subjugara Atenas e declarara que a cidade seria arrasada, caso a população não lhe enviasse, de nove em nove anos, um tributo constituído por sete donzelas e sete jovens, a quem esperava um destino atroz - ao chegarem a Creta, eram dados ao Minotauro, que os devorava.

O Minotauro era um monstro, meio toiro, meio homem, filho da mulher de Minos, Pasífae, e de um toiro maravilhosamente belo. Posídon oferecera esse animal a Minos, para que ele lho sacrificasse; o monarca, porém, não suportava sequer a ideia de matá-lo, e ficara com ele. Tinha sido Posídon, para castigar Minos da sua desobediência, que levara Pasífae a apaixonar-se loucamente pelo toiro.

Quando nasceu o Minotauro, Minos não o matou. Encarregou Dédalo, grande arquitecto e inventor, de construir um local de reclusão donde fosse impossível escapar. Dédalo concebeu o Labirinto, que ficou célebre em todo o mundo. Uma vez dentro, podiam seguir-se infinitamente os seus caminhos ziguezagueantes sem jamais se encontrar a saída. Os jovens atenienses, à chegada a Creta, eram conduzidos para o Labirinto e abandonados ao Minotauro. Não havia possibilidades de escapar! Qualquer que fosse a direcção que se tomasse podiam estar a encaminhar-se para o monstro; mas se não se deslocassem ele também podia surgir de um momento para o outro. Tal era a maldição que aguardava mais catorze jovens, alguns dias depois de Teseu ter chegado a Atenas - expirava o prazo em que devia efectuar-se o pagamento de uma nova prestação do tributo. Teseu ofereceu-se imediatamente como uma das vítimas. Todos o amavam pela sua bondade e o admiravam pela sua nobreza, mas não faziam ideia de que ele tencionava matar o Minotauro. Ao pai, no entanto, deu conta da sua intenção e prometeu-lhe que, se fosse bem sucedido substituiria a vela preta que o barco costumava levar sempre com a sua carga de miséria por uma branca, para que Egeu soubesse que o filho estava são e salvo muito antes de lhe falar.

Quando as jovens vítimas desembarcaram em Creta, desfilaram perante os habitantes da cidade, a caminho do Labirinto. A filha de Minos, Ariadna, encontrava-se entre os espectadores e, ao ver Teseu, apaixonou-se. por ele. Mandou chamar Dédalo, a quem pediu que lhe indicasse um processo de sair do Labirinto. Depois, ordenou que Teseu fosse à sua presença; prometeu-lhe arranjar maneira de o salvar. Teria, porém, de se comprometer a levá-la para Atenas e a casar com ela. Como é de calcular, Teseu não pôs quaisquer dificuldades e, então, Ariadna entregou-lhe a chave que Dédalo lhe dera... - um novelo de fio que devia ser atado a uma das extremidades do interior da porta de reclusão e, depois, desenrolado à medida que se fosse afastando. Teseu cumpriu à risca os conselhos, com a certeza de que, quando quisesse, podia reconstituir os próprios passos; caminhou, pois, ousadamente, em direcção ao interior do Labirinto, em busca do Minotauro. Quando chegou junto dele, por sorte o animal estava a dormir. Teseu caiu sobre ele, pregando-o ao chão, e, com os punhos - não tinha qualquer outra arma -, sovou o monstro até à morte.

(...)

Quando Teseu se ergueu, após aquela luta terrífica, o novelo de fio encontrava-se ainda onde o deixara – e com ele o caminho para a saída estava aberto. Os outros jovens seguiram-no e, levando Ariadna, refugiaram-se no barco, fazendo-se imediatamente ao mar, rumo a Atenas.

Na viagem de regresso aportaram à ilha de Naxos, e o que então aconteceu é contado em versões diferentes. Numa, Teseu abandonou Ariadna - ela estava a dormir e ele partiu só; entretanto Dioniso encontrara-a e reconfortara-a. A outra versão é muito mais favorável a Teseu - Ariadna estava extremamente enjoada e Teseu desembarcou-a para que melhorasse; o jovem herói voltara depois ao barco, para fazer qualquer trabalho necessário, e o vento forte tê-lo-ia arrastado para o mar alto, onde ficara retido durante muito tempo. Quando regressara, finalmente, Ariadna estava morta, e Teseu ficou profundamente perturbado.

Ambas as versões concordam em que, ao aproximar-se de Atenas, Teseu se esqueceu de arvorar a vela branca, quer pela alegria do êxito da sua viagem lhe ter absorvido completamente o pensamento, quer pela sua dor pela perda de Ariadna. O pai, o rei Egeu, avistou a vela negra da Acrópole onde durante dias e dias se cansara a perscrutar o horizonte. Aquele era o sinal da morte do filho; deitou-se ao mar, de um rochedo altíssimo, e morreu. Esse mar em que se despenhou ficou desde então, a chamar-se Egeu.

E assim Teseu se tornou rei de Atenas, um rei muito sábio e desinteressado da subjugação das massas. Declarou ao povo que não pretendia dominá-lo; queria um de governo do povo, onde todos fossem iguais. Abdicou do poder real e organizou uma comunidade; mandou construir um edifício para nele reunir o conselho, em que os cidadãos se ouviriam e exerceriam o direito de voto. O único cargo que manteve para si foi o de comandante-chefe. Atenas tornou-se assim entre todas as cidades, a mais feliz e a mais próspera, a única pátria autêntica da liberdade, o único local do mundo onde o povo se governava a si próprio.